A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) determinou a suspensão da oferta de criptomoedas pela Tools for Humanity (TfH), empresa responsável pelo projeto Worldcoin, em troca da coleta de íris no Brasil. A decisão foi tomada como medida preventiva e começou a valer no último sábado (25). Além disso, a empresa foi obrigada a disponibilizar em seu site a identificação do responsável pelo tratamento dos dados pessoais.
A ANPD considera que o uso de dados biométricos pela Worldcoin apresenta riscos significativos, especialmente porque a exclusão dessas informações é irreversível. Isso significa que, uma vez coletados, os dados das íris não podem ser apagados, mesmo que o usuário revogue seu consentimento. O órgão regulador enfatizou que o tratamento de dados sensíveis exige um nível elevado de proteção e transparência, e que a prática adotada pela empresa não atende integralmente aos requisitos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
Boulos aciona MPF para investigar a Worldcoin
A suspensão da ANPD acontece poucos dias depois de o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) solicitar ao Ministério Público Federal (MPF) uma investigação sobre as práticas da Worldcoin no Brasil. O parlamentar expressou preocupação com os possíveis impactos negativos da coleta de dados biométricos e questionou a falta de garantias de que as informações não serão utilizadas para fins indevidos no futuro.
Entre os principais riscos apontados por Boulos estão o uso dos dados para negar tratamentos médicos por parte de planos de saúde e a possibilidade de fraudes financeiras, caso criminosos obtenham acesso a esses registros e os utilizem para abrir contas bancárias ou realizar transações em nome de terceiros.
A Worldcoin, por sua vez, negou qualquer irregularidade e afirmou que está em conformidade com a legislação brasileira. Em nota, a empresa alegou que “relatos imprecisos e informações falsas” influenciaram a decisão da ANPD.
Consentimento pode ter sido comprometido
Em novembro de 2024, a Coordenação-Geral de Fiscalização (CGF) da ANPD abriu um processo para avaliar o tratamento de dados biométricos no contexto da World ID, identidade digital proposta pelo projeto. O objetivo declarado da Worldcoin é permitir que os indivíduos comprovem sua humanidade em um ambiente digital cada vez mais dominado por inteligência artificial.
No entanto, a ANPD considerou que o pagamento em criptomoedas pode comprometer a livre manifestação de vontade dos usuários. Para que o consentimento seja válido, ele precisa ser livre, informado, específico e inequívoco, conforme exige a LGPD. A oferta de uma recompensa financeira, principalmente para pessoas em situação de vulnerabilidade, pode influenciar sua decisão e levá-las a ceder seus dados sem total compreensão dos riscos envolvidos.
Worldcoin enfrenta resistência global
O projeto da Worldcoin foi lançado em julho de 2023 e rapidamente gerou controvérsia em vários países. A coleta de íris é feita por meio de um dispositivo chamado World Orb, que captura a biometria ocular e a registra em um sistema baseado em blockchain. Enquanto a empresa defende o projeto como uma inovação para segurança digital e autenticação global, críticos argumentam que ele pode abrir precedentes perigosos para vigilância em massa e uso indevido de dados pessoais.
Em países como França e Alemanha, reguladores já iniciaram investigações sobre o modelo de negócios da Worldcoin. Na Argentina, o projeto foi multado em R$ 1,2 milhão por cláusulas abusivas em seus contratos. Diante dessas pressões, Sam Altman anunciou medidas para aumentar a transparência, como permitir auditorias públicas do código-fonte do sistema e garantir que as informações de operação sejam acessíveis.
No entanto, mesmo com essas iniciativas, a Worldcoin continua enfrentando resistência regulatória em diversas partes do mundo. A decisão da ANPD insere o Brasil nesse grupo de países que enxergam riscos elevados na coleta de dados biométricos sensíveis, especialmente quando associados a incentivos financeiros.
Com informações de Portal do Bitcoin