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A Influência de Ícones Judaicos no Sertão e no Cangaço

A presença de símbolos judaicos no sertão nordestino e no cangaço revela uma rica intersecção cultural. Elementos como o chapéu de couro com a estrela de Davi, a alusão ao quipá e as alpargatas demonstram como tradições judaicas se integraram ao cotidiano e à história da região.


O chapéu de couro é um símbolo icônico do Nordeste brasileiro. Originalmente utilizado pelos vaqueiros para se protegerem dos galhos e espinhos da caatinga, este capacete de abas curtas também carrega uma forte carga simbólica. Adornado frequentemente com estrelas de seis pontas, o chapéu remete à estrela de Davi, acompanhada por tiras de couro nas laterais que simbolizam os peiot, as longas costeletas dos judeus ortodoxos. Este simbolismo se baseia na ordenança bíblica de Levítico 19:27: “Não raparás em torno de tua cabeça, nem tirarás as bordas da tua barba”.

Além disso, o chapéu nordestino é conhecido como uma personalização do quipá, o solidéu usado pelos judeus. O quipá simboliza a presença de Deus acima de tudo e é visto como um amuleto de proteção. Na caatinga, um cacto conhecido como quipá, devido ao seu formato arredondado, e a coroa-de-frade, outro cacto com espinhos que lembram a coroa de espinhos de Jesus Cristo, também fazem alusão a este simbolismo religioso.

Os primeiros judeus a chegar ao Nordeste brasileiro foram em grande número durante a Recife holandesa (1630–1654), estabelecendo-se principalmente em Pernambuco. 

Estes símbolos, frequentemente disfarçados para evitar perseguições religiosas, acabaram se mesclando ao cotidiano das vilas do sertão e dos praticantes da fé católica. Com o tempo, essas tradições judaicas se enraizaram na cultura local, mantendo um rastro da herança religiosa dos antigos colonos.

O cangaço, movimento de grande influência na história do Nordeste brasileiro, também incorporou ícones judaicos em seus adornos. Os chapéus dos cangaceiros, com abas maiores em formato de meia-lua, eram decorados com estrelas que, em combinação de três, representavam a trindade divina. Essas estrelas simbolizavam “em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”, reforçando a proteção divina.

Outro elemento culturalmente significativo é o tsitsit, um colete quadrado usado pelos judeus, que entre os cangaceiros se transformou em um lenço envolto no pescoço. As alpargatas, calçados rústicos de couro, também têm raízes profundas. Originalmente chamadas de alparcas, esses chinelos eram usados pelos guerreiros mouros que invadiram a Península Ibérica e, através dos portugueses e espanhóis, chegaram ao Brasil e outros países da América Latina.

Elementos da cultura árabe, intrinsecamente ligados ao judaísmo, continuam a influenciar os costumes e tradições do Nordeste brasileiro. Esta intersecção cultural revela uma herança rica e diversificada, ainda presente no cotidiano dos sertanejos.

Referência:
BARMONTE, Paulo César, http://www.oqqbuiquetem.com.br

Imagem de destaque: Juliette, BBB

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