A Rússia está fortalecendo suas relações militares com os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), em uma tentativa de expandir sua influência no espaço tradicionalmente dominado por Portugal. Desde as independências, esses acordos têm sido uma constante, mas as recentes declarações de Maria Zakharova, porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, indicam uma intensificação dessas parcerias, conforme prevê o major-general João Vieira Borges, coordenador do Observatório de Segurança e Defesa da SEDES.
Zakharova afirmou que Portugal adotou uma “postura ofensiva” em relação à Rússia, e que as relações diplomáticas entre os dois países estão em seu ponto mais baixo. Para o general Borges, isso sugere que Moscovo vê oportunidade de adentrar no espaço de influência português, especialmente nos PALOP. “Portugal está completamente na esfera do Ocidente, influenciado pelos Estados Unidos e pela NATO, e a Rússia se sente livre para agir nesses territórios,” declarou o general.
Angola é o principal parceiro da Rússia entre os PALOP, com um abrangente acordo de cooperação militar, técnico-militar e policial para os anos 2014-2020, que inclui a construção de fábricas de armamento em solo angolano. O plano de cooperação prevê o fornecimento de armamentos para as forças armadas angolanas, incluindo aviões de combate, navios de patrulha, e a modernização de veículos blindados.
Além disso, Angola tem sido um parceiro-chave da Rússia na exploração espacial, após alguns projetos de cooperação com a África do Sul terem sido marcados pela desconfiança. A colaboração no projeto de vigilância por satélite KONDOR-E é um exemplo dessa parceria estratégica.
Moçambique também tem acordos militares significativos com a Rússia, incluindo a proteção mútua de informações classificadas e procedimentos simplificados para a entrada de navios de guerra russos em portos moçambicanos. Moscovo tem interesse estratégico no porto de Nacala, o mais profundo da África Austral, visando possivelmente instalar uma base naval.
Na Guiné-Bissau, a Rússia perdoou uma dívida de 26 milhões de euros e assinou um acordo de cooperação técnico-militar, focado no fornecimento de armas e treinamento de pessoal. O país se absteve nas votações da ONU que condenaram a invasão russa da Ucrânia, mostrando alinhamento com Moscovo.
Cabo Verde, embora tradicionalmente alinhado ao Ocidente, assinou um acordo com a Rússia em 2018 para procedimentos simplificados de entrada de navios de guerra russos em seu território.
Esses movimentos refletem uma tentativa clara da Rússia de ampliar sua influência militar e estratégica nos PALOP, utilizando acordos de cooperação para fortalecer suas posições na região.