Mario Vargas Llosa, último gigante do Boom Latino-americano, morre aos 89 anos


O escritor peruano Mario Vargas Llosa, Nobel de Literatura em 2010 e ícone da geração que revolucionou as letras latino-americanas, faleceu neste domingo (13) em Lima, aos 89 anos. A morte foi confirmada por seus filhos em comunicado, que destacou: “Deixa uma obra que o sobreviverá”. Autor de clássicos como A Festa do Bode e Conversa no Catedral, Vargas Llosa foi o último sobrevivente do chamado “Boom” dos anos 1960-70, movimento que projetou nomes como Gabriel García Márquez e Julio Cortázar.


Do colégio militar ao Nobel: uma vida de rebeldias

Nascido em Arequipa (1936), Vargas Llosa teve a infância marcada pelo reencontro traumático com o pai, Ernesto Vargas, figura tirânica que o enviou ao colégio militar Leoncio Prado — experiência que inspirou seu primeiro romance, A Cidade e os Cachorros (1963). A obra, que retrata a violência e as hierarquias brutais da instituição, teve exemplares queimados por militares, mas consagrou-o como voz da nova literatura latina.

Viveu na França, Espanha e Inglaterra, onde se tornou “cidadão do mundo” sem perder o olhar crítico sobre o Peru. Sua fase de militância de esquerda (chegou a ser comunista nos anos 1950) deu lugar, décadas depois, a uma defesa ferrenha do liberalismo. Candidatou-se à presidência peruana em 1990, perdendo para Alberto Fujimori. “A liberdade é uma só: política, econômica, individual”, disse à BBC em 2019.

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Obras que rivalizam com a realidade

Mestre da “novela total”, Vargas Llosa misturava fatos históricos, crítica social e experimentação técnica. Em A Guerra do Fim do Mundo (1981), recriou o conflito de Canudos com precisão de historiador e imaginação de romancista. Já A Festa do Bode (2000), sobre o ditador dominicano Trujillo, é considerado seu último grande épico.

Sua vida pessoal também alimentou a ficção: o casamento proibido com a tia Julia Urquidi, 11 anos mais velha, virou o best-seller A Tia Júlia e o Escrevinhador (1977). Nas décadas finais, surpreendeu ao trocar Patricia Llosa, companheira por 50 anos, pela socialite espanhola Isabel Preysler — capítulo que rendeu manchetes em revistas de fofoca, gênero que desdenhava.


Do “Boom” ao soco em García Márquez

Figura controversa, Vargas Llosa personificou as contradições de sua geração. Amigo íntimo de García Márquez nos anos 1960, rompeu com o colombiano em 1976 com um soco no rosto durante evento no México — motivo nunca esclarecido. Defensor inicial da Revolução Cubana, tornou-se crítico após o “Caso Padilla” (1971), quando intelectuais foram perseguidos por Fidel Castro.

Sua conversão ao liberalismo, influenciada por pensadores como Isaiah Berlin, chocou antigos aliados. Apesar disso, manteve posições progressistas: defendia casamento gay, legalização das drogas e era crítico da ocupação israelense na Palestina.


Legado: entre a literatura e a política

Vencedor do Prêmio Cervantes (1994) e Nobel (2010), Vargas Llosa foi o primeiro autor não francófono a ingressar na Academia Francesa de Letras (2022). Deixou 20 romances, peças teatrais e ensaios que debatem desde o erotismo (Os Cadernos de Dom Rigoberto) até a ficção histórica (O Sonho do Celta).

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Sua morte encerra um ciclo. “Cada partida de xadrez entre Vargas Llosa e García Márquez está perdida”, lamentou o crítico espanhol Jordi Gracia. Restam as obras — e a lição de que, como escreveu o peruano em A Festa do Bode, “a literatura é insurreição permanente”.


5 obras essenciais:

  1. A Cidade e os Cachorros (1963)
  2. Conversa no Catedral (1969)
  3. A Guerra do Fim do Mundo (1981)
  4. A Festa do Bode (2000)
  5. Tia Julia e o Escrevinhador (1977)

Por Redação, com informações da BBC News Brasil

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