A exemplo do Kremlin, Parlamento georgiano quer conter “influência estrangeira” na sociedade civil. Críticos temem afastamento do Ocidente, que diz acompanhar caso com “preocupação”.O avanço na Geórgia de um controverso projeto de lei para conter a “influência estrangeira” levou nesta quinta-feira (02/05) dezenas de milhares de pessoas às ruas da capital Tiblissi na terceira noite seguida de protestos.
O texto, que está prestes a ser aprovado em caráter definitivo pelo Parlamento, determina que todas as organizações, meios de comunicação e entidades similares que recebam ao menos 20% do seu financiamento do exterior se registrem como “agentes a serviço de interesses de uma potência estrangeira”.
Manifestações contrárias à medida vêm sendo duramente reprimidas pela polícia há cerca de um mês. A lei já passou por votação em dois turnos no Parlamento; se passar a terceira, bastará uma assinatura do presidente Salome Zurabishvili para que entre em vigor.
Críticos temem que o país esteja seguindo o exemplo da vizinha Rússia ao fechar o cerco contra dissidentes do governo parlamentarista em Tiblissi, que é ideologicamente mais alinhado a Moscou. Lá, uma iniciativa semelhante está em vigor desde 2012 e resultou no banimento de diversas ONGs.
“Uma organização ambiental que faça campanha pela conservação da natureza e receba uma doação de um parceiro estrangeiro será subitamente considerada como representante de interesses estrangeiros. Ou um veículo de mídia independente que não represente os interesses de ninguém”, afirma Marcel Röthig, diretor do escritório regional no Cáucaso do Sul da Fundação Friedrich Ebert, ligada ao SPD, o partido alemão social-democrata.
Alto comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk se disse preocupado com o “uso desproporcional de força” contra manifestantes e imprensa, e exortou as autoridades da Geórgia a “respeitar e proteger plenamente o direito à liberdade de expressão e reunião pacífica”.
Para Türk, “rotular as ONGs e os meios de comunicação que recebem financiamento estrangeiro como ‘organizações que atuam no interesse de uma potência estrangeira’ constitui uma séria ameaça aos direitos à liberdade de expressão e de associação”.
Tanto ele quanto o Parlamento Europeu apelaram aos líderes do país para que recuem da lei. Os eurodeputados recomendaram ainda à Geórgia que concentre “seus esforços nas reformas necessárias para a adesão” à União Europeia e à Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).
Chefe da direção de ampliação da Comissão Europeia, Gert Jan Koopman, disse que a lei prejudica as aspirações da Geórgia de um dia juntar-se ao bloco europeu e que o país tem tomado um rumo “preocupante”. “A lei (…) é inaceitável e vai criar sérios obstáculos à ascensão à UE”, afirmou a jornalistas em Tiblissi.
Embaixador americano na Geórgia, Robin Dunnigan adotou tom semelhante, dizendo que as escolhas do governo georgiano “afastam o país de seu futuro euro-atlântico”. Nas palavras do porta-voz de segurança nacional da Casa Branca, John Kirby, os Estados Unidos estão “profundamente preocupados” com a nova legislação.
Para o Ministério do Exterior francês, o texto é “contrário aos valores fundacionais da União Europeia e aos quais o povo georgiano demonstrou estar profundamente ligado”.
(AFP, Reuters, Lusa, AP, DW)