Em meio ao desastre climático que afetou o Rio Grande do Sul, a disseminação de desinformação sobre as enchentes tem se intensificado. Influenciadores e parlamentares de extrema direita estão sendo investigados pela Polícia Federal por suas postagens nas redes sociais, que exaltam o trabalho de voluntários enquanto atacam a ação de governos e das Forças Armadas.
Segundo o professor de sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Yurij Castelfranchi, a desinformação no Brasil é um fenômeno político que se agrava em situações de crise como essa. Castelfranchi é coautor de uma pesquisa do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), que constatou que temas ambientais e mudanças climáticas são de grande interesse público, mas também frequentemente alvo de fake news.
Especialistas afirmam que catástrofes como a do Rio Grande do Sul favorecem a circulação de desinformação, principalmente por perfis alinhados à extrema direita. Fabrício Pontin, professor de Relações Internacionais da Universidade LaSalle, destaca que essas notícias falsas exploram a desconfiança da população em relação ao setor público, fortalecendo uma visão “anti-Estado”.
A disseminação de fake news foi evidenciada pelo grupo de pesquisa da USP Monitor Político, que identificou um aumento significativo de mensagens “anti-Estado” nas redes sociais durante a tragédia. Entre as fake news mais compartilhadas estão alegações de que a Receita Federal teria barrado caminhões com doações e que voluntários foram impedidos de realizar resgates.
As consequências políticas dessa desinformação são preocupantes. Pontin alerta que isso pode custar vidas, já que desvia a atenção das orientações essenciais para a segurança da população. Além disso, o fenômeno fortalece a polarização política, com influenciadores e políticos ampliando o alcance dessas falsas narrativas.
Para especialistas, a mobilização da desinformação pela extrema direita visa ganhar espaço nas eleições municipais de outubro. Christian Gonzatti, professor da Universidade do Rio dos Sinos (Unisinos), explica que essa estratégia digital é usada para manter o eleitorado engajado e criar lideranças políticas.
As plataformas de redes sociais também têm um papel crucial na disseminação de fake news. Gonzatti aponta que a arquitetura dessas redes é projetada para manter os usuários consumindo conteúdo, o que favorece a circulação de desinformação. Pontin acrescenta que a disseminação de notícias falsas é não só uma estratégia política, mas também um modelo de negócios lucrativo para essas plataformas.
O governo brasileiro tem reagido à campanha de fake news. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nomeou o ministro Paulo Pimenta para liderar a secretaria extraordinária de reconstrução do Rio Grande do Sul e anunciou um pacote de R$ 50 bilhões para apoiar as vítimas das enchentes. Além disso, a Advocacia-Geral da União (AGU) denunciou a campanha de desinformação à Polícia Federal para evitar que os esforços de socorro sejam prejudicados.
Apesar das ações governamentais, os especialistas criticam a falta de políticas ambientais preventivas. A ONG Observatório do Clima mapeou projetos de lei e propostas de emenda à Constituição que enfraquecem a proteção ambiental, contribuindo para a vulnerabilidade do Brasil a desastres climáticos.