Partidos de diferentes espectros políticos relatam crescimento de caixa dois e compra de votos nas eleições de 2024, com preocupações sobre a atuação de facções criminosas.
Dirigentes e políticos de partidos de esquerda à direita afirmam que as eleições municipais de 2024 registraram um aumento significativo de práticas ilegais, como caixa dois, compra de votos e infiltração de facções criminosas no processo eleitoral. Esses relatos vêm acompanhados de denúncias sobre a crescente influência do crime organizado na política e surgiram tanto em discursos no Congresso quanto em investigações da Polícia Federal e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
A situação é preocupante, especialmente considerando o uso de verbas públicas tanto nas campanhas eleitorais, que somaram R$ 6,2 bilhões, quanto nas emendas parlamentares, que superaram R$ 50 bilhões em 2024. A apreensão de valores ilícitos pela Polícia Federal em todo o Brasil reforça essas preocupações. Somente neste ano, foram confiscados R$ 50,4 milhões relacionados a crimes eleitorais, com R$ 21,8 milhões em dinheiro vivo, superando os valores das eleições gerais de 2022.
Em discurso na Câmara dos Deputados, o deputado José Nelto (União Brasil-GO) destacou o que classificou como “a maior derrama de dinheiro no processo eleitoral do Brasil”, relatando a disseminação da compra de votos e a circulação de grandes quantias de dinheiro em diversos estados. A deputada Adriana Ventura (Novo-SP) também denunciou o que chamou de “show de horror” nas eleições, mencionando a venda de emendas parlamentares e a utilização de verbas públicas de forma indevida.
Outro relato veio do deputado federal Jilmar Tatto (PT-SP), que mencionou casos em cidades do interior do país, onde foram observados diversos episódios de distribuição de dinheiro vivo, principalmente às vésperas do pleito. O deputado federal Kiko Celeguim (PT-SP) foi ainda mais longe, afirmando que o crime organizado, incluindo facções como o PCC, está envolvido não apenas em contratos públicos, mas também nas campanhas eleitorais.
A Polícia Federal confirma essas apreensões, mas os parlamentares evitam citar nomes ou casos específicos. Relatos semelhantes surgem de fontes anônimas ou reservadas. Já o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), líder do governo no Congresso, afirmou que o caixa dois, envolvendo o uso de dinheiro empresarial não declarado, continua ativo nas eleições.
Além da questão do caixa dois, a infiltração de facções criminosas no processo eleitoral também tem sido motivo de preocupação. O senador Davi Alcolumbre (AP), em sessão da Comissão de Constituição e Justiça, relatou o envolvimento direto de facções em candidaturas de vereadores, vice-prefeitos e prefeitos. Ele afirmou que esses grupos criminosos estão presentes tanto em pequenos municípios quanto em grandes centros urbanos, atuando em esquemas licitatórios e diretamente nas campanhas eleitorais.
A presidente do TSE, Cármen Lúcia, expressou seu temor sobre a gravidade da situação, destacando a ousadia do crime organizado em tentar moldar as leis do país. Ela também alertou para o risco de essa influência se expandir para níveis estaduais e até nacionais.
Alguns políticos, como Randolfe Rodrigues e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, defendem a volta do financiamento empresarial das campanhas, proibido pelo STF em 2015. Eles argumentam que isso poderia conter o avanço do caixa dois, embora críticos temam que essa mudança possa abrir caminho para novos casos de corrupção e relações indevidas entre empresários e políticos.
Mesmo com a proibição do financiamento direto por empresas, brechas na legislação ainda permitem que executivos dessas corporações façam doações como pessoa física, o que mantém, em menor escala, a presença de recursos empresariais nas campanhas eleitorais.
Texto adaptado de Folha de S.Paulo e revisado pela nossa redação.