O governo federal do Brasil manifestou forte oposição ao projeto de lei que equipara o aborto após 22 semanas de gestação ao homicídio, criticando a medida por ser desumana e desrespeitosa com as mulheres. Ministros e a primeira-dama Janja da Silva destacaram a injustiça de penalizar mulheres estupradas mais severamente que seus agressores.
O governo federal do Brasil adotou uma posição firme contra o projeto de lei que equipara o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio, após diversas reações negativas. O texto, que teve sua tramitação em regime de urgência aprovada nesta semana na Câmara dos Deputados, foi criticado por ministros e pela primeira-dama Janja da Silva.
Na sexta-feira, os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Marina Silva (Meio Ambiente), Cida Gonçalves (Mulheres) e a primeira-dama Janja da Silva expressaram sua desaprovação à proposta. Apesar disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ainda não se manifestou publicamente sobre o projeto, mencionando na quinta-feira, durante uma visita à Suíça, que precisava retornar ao Brasil para se inteirar melhor do assunto antes de comentar.
Na votação de quarta-feira, o governo e o Partido dos Trabalhadores (PT) adotaram uma postura de neutralidade. O líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que a proposta “não é matéria de interesse do governo”. Os partidos da base governista permitiram que o texto fosse apreciado diretamente no plenário, sem passar pelas comissões da Casa, ao aderirem à votação simbólica.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, também criticou a proposta nas redes sociais, destacando a injustiça de aplicar penas mais severas a mulheres estupradas que abortam em comparação aos seus agressores. “Pessoalmente sou contra o aborto, mas defendo o que está previsto na nossa legislação”, escreveu Hoffmann, acrescentando que a proposta é desumana, especialmente em casos envolvendo meninas estupradas.
O ministro Padilha afirmou que o governo se mobilizará contra o projeto: “Não contem com o governo para mudar a legislação de aborto no país, ainda mais num projeto que estabelece que uma mulher estuprada vai ter uma pena duas vezes maior que a do estuprador. Vamos trabalhar para que um projeto como esse não seja votado.”
Uma pesquisa da Quaest, baseada em 1,1 milhão de menções sobre o tema nas redes sociais entre os dias 12 e 14 de junho, revelou que 52% das publicações foram contrárias ao projeto, enquanto apenas 15% eram favoráveis.
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, classificou a proposta como “altamente desrespeitosa e desumana com as mulheres”. Apesar de ser pessoalmente contra o aborto, Marina Silva criticou a injustiça de se aplicar uma pena mais severa às mulheres estupradas.
Janja da Silva, que acompanhava Lula na viagem à Europa, também se manifestou nas redes sociais, destacando a discrepância nas penas para mulheres estupradas que abortam e seus agressores. “O PL 1904/24 quer mudar o Código Penal brasileiro para equiparar o aborto após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, quando a gestação for fruto de estupro, caso em que o aborto é permitido pela lei brasileira”, escreveu a primeira-dama.
Além das manifestações desta sexta-feira, outros ministros, como Cida Gonçalves (Mulheres), Anielle Franco (Igualdade Racial), Sonia Guajajara (Povos Indígenas), Silvio Almeida (Direitos Humanos) e Paulo Teixeira (Desenvolvimento Agrário), já haviam se posicionado contra a proposta nas redes sociais.
Em declaração ao jornal O Globo, Cida Gonçalves reiterou sua crítica ao projeto, afirmando: “Nós não podemos, enquanto sociedade, permitir um retrocesso como este. Não se trata de um debate político ou religioso, estamos falando da garantia da vida e do respeito à dignidade de meninas e mulheres.”