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Conflitos pelo Pirarucu na Amazônia: Tese Revela Tensões em Comunidade do Amazonas

Na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Amanã, no Amazonas, a pesca do pirarucu (Arapaima gigas) é palco de embates entre manejadores e invasores, conforme estudo do antropólogo Rônisson de Oliveira, publicado pelo Jornal da Unicamp em 16 de junho de 2025. Natural de São Paulo do Coraci, Oliveira analisou, em sua tese de doutorado no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) da Unicamp, como as políticas de conservação iniciadas nos anos 2000 transformaram as relações entre pescadores e o peixe, revelando divisões na comunidade e a complexidade do território amazônico.

Origem do Conflito

Até 1998, com a criação da RDS Amanã, os “invasores” eram pescadores externos, vindos de Manaus ou do Pará em grandes barcos, conhecidos como “peixeiros”. Após a implementação do manejo sustentável, que regula a pesca para proteger o pirarucu, surgiram os “invasores de dentro”: moradores locais que não aderem às regras de conservação. Oliveira, que retornou à sua comunidade como pesquisador, percebeu a divisão entre manejadores, que seguem os acordos, e não manejadores, que pescam fora das normas, gerando tensões. “Por que estão brigando tanto por isso?”, questionava-se, motivando sua pesquisa.

Dinâmica do Pirarucu

A tese adota uma abordagem multiespécie, colocando o pirarucu como protagonista ao lado dos pescadores. Oliveira destaca que o peixe tem uma dinâmica própria, não se subordinando aos interesses humanos. “O pirarucu não vai atender nem aos manejadores, nem aos invasores, mas à sua própria sobrevivência”, explica. Na comunidade, o peixe é tratado quase como gente, refletindo uma relação próxima, conforme observações da antropóloga Manuela Carneiro Cunha. Essa dinâmica complica o manejo, já que o pirarucu segue ciclos naturais, como a cheia (dezembro a maio), quando a pesca é proibida.

Para Entender de Forma Simples

Imagine uma comunidade dividida por um recurso valioso, o pirarucu, um peixe gigante da Amazônia. Alguns moradores seguem regras para protegê-lo, enquanto outros pescam sem controle, causando brigas. O peixe, porém, vive sua própria vida, dificultando os planos de ambos os lados. A pesquisa mostra como essas tensões revelam o desafio de equilibrar conservação e sobrevivência local.

Motivos da Divisão

Os não manejadores evitam o sistema por razões como burocracia, questões religiosas ou dificuldade em cumprir os acordos. Ainda assim, Oliveira nota que esses “invasores” não são contra a conservação, pois dependem do território onde vivem. “Eles têm um compromisso com o lugar, mesmo não seguindo todas as regras”, afirma. O manejo, que aumentou a população de pirarucus de 2.507 para 190.523 entre 1999 e 2018, segundo o Instituto Mamirauá, trouxe benefícios, mas também conflitos, já que exige organização e disciplina nem sempre acessíveis a todos.

Metodologia e Conexão Pessoal

Oliveira realizou dez viagens a São Paulo do Coraci, com estadias de 5 a 30 dias, participando de reuniões, entrevistando moradores e analisando atas. Sua reconexão com a comunidade, onde enfrentou perguntas como “Tu garante?” (sobre sua resistência ao trabalho local), foi um processo de adaptação. Como pesquisador do Instituto Mamirauá, ele inicialmente estudava práticas tradicionais, mas o conflito interno na comunidade redirecionou sua tese, que critica políticas públicas que ignoram a complexidade amazônica.

Impacto e Relevância

A pesquisa destaca a importância de pensar “com a Amazônia”, não apenas sobre ela, como diz Oliveira. O manejo do pirarucu, premiado pelo Rolex de Empreendedorismo em 2019, é um sucesso ecológico e social, beneficiando a biodiversidade e a renda de ribeirinhos, especialmente mulheres, conforme dados do Instituto Mamirauá. Porém, os conflitos mostram que soluções externas nem sempre consideram as dinâmicas locais. O estudo reforça a necessidade de políticas que respeitem saberes tradicionais e promovam diálogo para reduzir tensões, garantindo a sustentabilidade do pirarucu e das comunidades amazônicas.

Fontes: Jornal da Unicamp, Instituto Mamirauá, posts no X.

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