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Megaesquema: Fraude no Farmácia Popular Financia Tráfico Internacional com Rede de Farmácias Fantasmas

Uma vasta investigação da Polícia Federal revelou um esquema sofisticado onde um grupo criminoso desviou quase R$ 40 milhões do programa Farmácia Popular. O dinheiro, obtido através de uma rede de farmácias de fachada em diversas regiões do Brasil, era não só lavado, mas também usado para financiar a compra de cocaína na Bolívia e no Peru, conectando diretamente a saúde pública com o tráfico internacional de drogas.

As fraudes envolviam o uso fraudulento de CPFs e endereços de pessoas inocentes, além da aquisição e venda de CNPJs por “laranjas”. As primeiras pistas surgiram com uma apreensão de drogas em Luziânia (GO), mas a teia criminosa logo se expandiu para outros estados como Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul.

Em Águas Lindas (GO), a comunidade do Portal da Barragem descobriu, revoltada, que duas farmácias que nunca existiram fisicamente teriam recebido, juntas, quase R$ 500 mil do programa. “É uma tremenda sacanagem, né? A gente mora aqui há cinco anos e de repente fica sabendo que nesse endereço residia uma farmácia que recebeu R$ 329 mil. É demais, né?”, desabafou uma moradora, ressaltando que, apesar da documentação, os moradores garantem que “nunca teve farmácia aqui”.

O intrincado Rastro da Investigação da PF

O desvendamento do esquema começou com a apreensão de 191 quilos de drogas com um caminhoneiro vindo de Rondônia. Parte da carga foi entregue em Ribeirão Preto (SP), e o restante em Luziânia, destinada a Clayton Soares da Silva, apontado como dono de farmácias no Rio Grande do Sul e em Pernambuco que integrariam a fraude. A prisão de Clayton e do caminhoneiro revelou, através de documentos e mensagens em seu celular, a complexa operação do grupo.

As evidências levaram a Fernando Batista da Silva, conhecido como “Fernando Piolho”, suposto chefe da organização. A investigação aponta que ele usava o nome da filha para abrir empresas e movimentar grandes somas de dinheiro sem despertar suspeitas. Uma dessas empresas, a Construarte, teria recebido mais de R$ 500 mil de indivíduos investigados ou presos por tráfico.

A PF afirma que Fernando possuía ligações com membros do Comando Vermelho e que o grupo repassava valores a pessoas próximas às fronteiras com Peru e Bolívia. Entre os beneficiários, está a esposa de um integrante do Clã Cisneros, uma organização criminosa peruana com laboratórios de cocaína. O advogado de Fernando, no entanto, nega o envolvimento de seu cliente.

José Roberto Peres, superintendente da PF do Distrito Federal, sintetiza a estratégia criminosa: “Essa organização criminosa utilizou o programa Farmácia Popular para fazer a lavagem desses recursos. Posteriormente, ela passou a utilizar esse programa social para investir no próprio tráfico de drogas”. A conexão entre tráfico e fraudes tornou-se ainda mais evidente com a descoberta de farmácias registradas em lotes vazios, como um terreno com mato que supostamente utilizava um telefone de João Pessoa (PB). O número pertencia a Célia Aparecida de Carvalho, apontada como fornecedora de CNPJs para o esquema.

Vítimas e Entrelace de Laranjas

O programa Farmácia Popular, essencial para milhões de brasileiros ao oferecer medicamentos gratuitos ou com grandes descontos, tornou-se alvo da cobiça criminosa. Rafael Bruxellas Parra, diretor do Departamento Nacional de Auditoria do SUS, revelou que são combatidas cerca de 140 mil tentativas de autorizações irregulares no programa diariamente.

O dentista Gustavo, de Sumaré (SP), foi uma das vítimas. Ao consultar seu Conecte SUS, descobriu que seu CPF havia sido usado para a retirada mensal de até 20 caixas de insulina, mesmo sem ser diabético. A falsa transação foi registrada em Campo Belo (MG), na Drogaria PHS Limitada, cuja suposta compradora era Francisca Ferreira de Souza, uma empregada doméstica registrada como dona de cinco farmácias em estados distintos. Francisca, que mora em uma casa simples em Luziânia, movimentou quase R$ 500 mil no papel apenas com a farmácia mineira, e é casada com Brazilino Inácio dos Santos, investigado por ser sócio de dez empresas que, juntas, movimentaram R$ 2,5 milhões entre 2018 e 2019.

A PF investiga se esse dinheiro foi repassado a Fernando Piolho. A trama ainda envolve Célia Aparecida Carvalho, que negociou farmácias com Adriano Rezende Rodrigues, o Adriano Tatu. Uma das drogarias da qual Tatu é sócio, em Cerquilho (SP), recebeu quase R$ 1 milhão do Farmácia Popular. No total, a quadrilha utilizou cerca de 160 mil CPFs e 148 farmácias (reais ou de fachada), desviando uma fortuna que impacta diretamente a população brasileira, que depende de programas sociais como o Farmácia Popular.

Da redação com informações do Fantástico [GME-GOO-21072025-0833-25F]

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