A saga dos crânios de Lampião e Maria Bonita: de segredo de família a objeto de estudo da USP
Os restos mortais do casal, guardados por 20 anos pela família, foram submetidos a uma reconstrução e análise que revelou detalhes inéditos sobre a vida e a morte dos reis do cangaço
Por mais de duas décadas, a família de Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e de Maria Gomes de Oliveira, a Maria Bonita, escondeu os crânios dos dois ícones do cangaço. Expedita Ferreira, de 92 anos, filha do casal, e a neta Gleuse Ferreira, de 69 anos, revelaram que os crânios foram guardados em uma caixa, levada do Instituto Médico Legal de Salvador, e ficavam guardados em casa, como se fossem “uma roupa ou um sapato”. O segredo de família, agora revelado, mostra o esforço em preservar a memória e a dignidade dos seus entes queridos após a exposição pública de seus restos mortais.
Em 2021, a família decidiu ceder os crânios para o Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) para uma análise mais aprofundada. O trabalho, que incluiu a reconstrução facial, revelou dados surpreendentes. O crânio de Maria Bonita estava intacto, enquanto o de Lampião era uma série de fragmentos, uma imagem que a bisneta Gleuse comparou a “caquinhos de coco seco”. A análise do crânio de Lampião mostrou evidências de decapitação e fraturas “perimortem”, que indicam um tratamento brutal no momento e logo após sua morte.
A identidade dos crânios, que foram expostos por 25 anos no Instituto Médico Legal Nina Rodrigues, em Salvador, é inquestionável para os pesquisadores. O historiador José Guilherme Veras Closs, um dos responsáveis pelo estudo, afirmou que todas as evidências, teorias e provas confirmam que aqueles são os crânios que vieram de Alagoas, em 1938, e que pertenciam a Lampião e Maria Bonita. A tentativa de extrair material genético para comparação de DNA falhou, no entanto, porque a manipulação e o armazenamento em soluções como querosene acabaram deteriorando o material genético.

O estudo, que detalhou a péssima saúde bucal de Lampião e o complexo trabalho de reconstituição, vai além de um simples registro histórico. Para os pesquisadores, a iniciativa busca olhar para Lampião e Maria Bonita como seres humanos, para além da figura de heróis ou bandidos. O respeito pela memória e o cuidado com os restos mortais são o foco principal, segundo os especialistas. O próximo passo da família é tirar do papel um projeto para a construção de um museu, um memorial do cangaço, para abrigar não apenas os crânios, mas um vasto acervo de objetos pessoais, armas, joias, mechas de cabelo de Maria Bonita e fotografias que pertenciam ao casal, sob a curadoria e aprovação da família Ferreira, para que o público possa conhecer de perto a história do cangaço no Nordeste.
Da redação com informações do g1
Redação do Movimento PB GME-GOO-14082025-C1E9D7-25F