BR

‘Guerra dos Postes’: Impasse judicial sobre preço de referência afeta expansão da internet no Brasil

Estudo revela falta de consenso nos tribunais sobre valores de compartilhamento, gerando insegurança jurídica e afetando investimentos em telecomunicações.

Uma indefinição que se arrasta há anos nos tribunais brasileiros sobre a aplicação do ‘preço de referência’ para o compartilhamento de postes continua a alimentar a chamada ‘guerra dos postes’. Um amplo estudo sobre o tema revela que a Justiça ainda não consolidou um entendimento sobre o valor definido pela Resolução Conjunta Aneel/Anatel nº 4/2014, criando um cenário de insegurança jurídica que afeta diretamente os investimentos e a expansão da infraestrutura de internet no país.

O conflito opõe distribuidoras de energia elétrica, que detêm os postes, e empresas de telecomunicações, que precisam alugar espaço para passar seus cabos.

Justiça fragmentada

O mapeamento, encomendado pela Associação Brasileira das Prestadoras de Serviços de Telecomunicações Competitivas (TelComp), analisou 695 sentenças emitidas entre 2014 e 2025. Os dados mostram um Judiciário fragmentado. Na primeira instância, prevalece a ausência de consenso: de 491 sentenças analisadas, 224 foram favoráveis à aplicação do preço de referência e 267 foram contrárias.

Já na segunda instância, o estudo aponta um “movimento de correção regulatória”. Os tribunais estaduais têm revertido parte das decisões, reconhecendo o poder regulatório das agências. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG), por exemplo, reverteu todas as sentenças desfavoráveis às operadoras analisadas. Na contramão, o TJ do Distrito Federal aplicou a regra em apenas 10% dos casos.

O impasse maior, no entanto, ocorre nos tribunais superiores. O tema não consegue avançar para análise de mérito no Superior Tribunal de Justiça (STJ) nem no Supremo Tribunal Federal (STF). O relatório aponta que os recursos são frequentemente barrados pelas Súmulas 5 e 7 do STJ, que limitam o reexame de provas e cláusulas contratuais, impedindo que os tribunais fixem um entendimento uniforme.

Insegurança e investimentos

Para Luiz Henrique da Silva, presidente executivo da TelComp, a falta de previsibilidade afeta a expansão da rede. “Investir no Brasil se torna mais arriscado, e o resultado é uma expansão mais lenta da infraestrutura digital”, alertou. Ele destacou que a Resolução 4/2014 foi criada para evitar abusos por parte das distribuidoras que controlam a infraestrutura, mas “a verdade é que ninguém cumpriu”.

As empresas de energia defendem que o valor estabelecido seja apenas um parâmetro indicativo, e não uma imposição. Já as operadoras de telecomunicações argumentam que, sem esse valor, ficam sujeitas a monopólios regionais e cobranças abusivas, o que encarece o serviço para o consumidor final.

O papel das agências

Em nota, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) afirmou que, embora não conhecesse o estudo, a legislação (Artigo 73 da Lei Geral de Telecomunicações) garante às teles o direito de uso da infraestrutura “a preços e condições justos e razoáveis”.

A agência destacou que cabe às distribuidoras de energia elétrica, “enquanto cessionárias da infraestrutura”, fazer a adequada gestão do uso compartilhado de postes”, atividade pela qual são remuneradas. A Anatel também ressaltou que as distribuidoras têm o poder de retirar cabos em situações de risco ou ocupação clandestina.

A Anatel informou ainda que, junto com a Aneel, tem trabalhado no “aprimoramento da regulamentação conjunta”. No entanto, a agência revelou um impasse entre os reguladores: A Anatel aprovou sua proposta de Resolução Conjunta em outubro de 2023, mas recebeu “com preocupação” a decisão da Aneel, em julho de 2024, de extinguir o processo e determinar nova instrução da matéria.

Procurada pela reportagem original do Estadão, a Aneel não se manifestou.

Da redação do Movimento PB.

[MNG-OOG-11112025-7E4A2B9-V018]