Descoberta arqueológica na Paraíba é reconhecida como uma das mais importantes do mundo por revista internacional

Arte rupestre interage com pegadas de dinossauros em sítio pré-histórico e revela conexão cultural milenar no sertão nordestino

Uma descoberta arqueológica na Paraíba acaba de ser reconhecida como uma das mais relevantes do mundo em 2024. A tradicional revista científica Archaeology Magazine incluiu o achado brasileiro em sua lista anual das dez maiores descobertas arqueológicas globais. A pesquisa, publicada originalmente na Scientific Reports, revelou uma interação inédita entre arte rupestre pré-histórica e pegadas fossilizadas de dinossauros, revelando uma forma de expressão simbólica que une humanos e registros paleontológicos em um mesmo contexto.

O estudo foi liderado por Leonardo Troiano, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), com participação da paleontóloga Aline Ghilardi, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). O achado ocorreu no Sítio Arqueológico Serrote do Letreiro, no interior da Paraíba, que agora ganha status de referência científica internacional.

Conexão entre humanos da Idade da Pedra e pegadas de dinossauros

O que torna essa descoberta tão singular é a evidência clara de que humanos que habitaram a região há mais de 9 mil anos reconheceram e interagiram simbolicamente com pegadas fossilizadas de dinossauros carnívoros que viveram no local há aproximadamente 140 milhões de anos.

No Serrote do Letreiro, foram mapeados mais de 50 petróglifos — figuras gravadas em rochas — desenhados sobre ou ao lado das trilhas fossilizadas. Muitos desses petróglifos apresentam formas semelhantes às pegadas dos dinossauros, o que indica que os habitantes da época reproduziam essas marcas com possíveis propósitos simbólicos ou ritualísticos.

De acordo com os pesquisadores, esta é a primeira vez que se documenta uma associação intencional entre arte rupestre e registros paleontológicos, o que transforma a área em um verdadeiro palimpsesto milenar — uma superfície reutilizada ao longo do tempo para transmitir diferentes mensagens.

Homo sapiens reconheceram pegadas e interagiram com elas culturalmente

Embora o local já fosse conhecido desde a década de 1980, quando o arqueólogo e padre Giuseppe Leonardi identificou sua relevância, só nos últimos anos, com o avanço das tecnologias de mapeamento, foi possível analisar os petróglifos com precisão. As investigações atuais demonstram que os Homo sapiens, há pelo menos 10 mil anos, reconheciam as formas das pegadas de dinossauros e as incorporavam às suas práticas culturais.

Alguns dos petróglifos são cópias exatas das trilhas fossilizadas, o que sugere uma compreensão simbólica desses vestígios antigos. Mesmo que o significado exato dessas manifestações não possa ser totalmente decifrado, a sobreposição intencional entre arte rupestre e pegadas fósseis revela uma ponte entre duas eras geológicas distantes: o Cretáceo e o Holoceno.

Uma união rara entre arqueologia e paleontologia

A descoberta também é notável por unir duas disciplinas distintas — arqueologia e paleontologia — em um mesmo sítio. Enquanto a paleontologia estuda fósseis de organismos extintos, a arqueologia analisa artefatos e manifestações culturais humanas. No Serrote do Letreiro, essas áreas se sobrepõem de maneira concreta e rara.

As pegadas fossilizadas pertencem, em sua maioria, a dinossauros terópodes, um grupo de carnívoros. Já a arte rupestre foi produzida entre 9000 e 3000 anos atrás, abarcando desde o fim da Idade da Pedra até os primeiros registros do uso do cobre no território brasileiro.

“Trata-se de uma sobreposição que mostra um diálogo entre seres humanos e o passado profundo da Terra”, afirma Leonardo Troiano. “Essas pessoas não apenas notaram as pegadas. Elas interagiram com elas de forma simbólica, incorporando esses rastros em sua linguagem visual.”

Reconhecimento internacional e proteção do patrimônio

A inclusão do Serrote do Letreiro na lista da Archaeology Magazine coloca o Brasil no centro do cenário arqueológico mundial. A publicação é uma das mais respeitadas do setor e destaca apenas descobertas com importância global. Além da descoberta paraibana, a lista de 2024 inclui achados no Egito, Grécia, Turquia, Itália e México.

Para a paleontóloga Aline Ghilardi, a repercussão do estudo reforça a urgência da preservação dos sítios arqueológicos e paleontológicos brasileiros. “Essas evidências estão ao ar livre, expostas à erosão, ao vandalismo e à ignorância. Precisamos valorizar e proteger esses locais”, declarou.

A equipe de pesquisadores agora busca apoio para que o Serrote do Letreiro seja reconhecido oficialmente como patrimônio cultural brasileiro e internacional. O objetivo é garantir a conservação do local e estimular o turismo científico, a educação ambiental e novas pesquisas interdisciplinares no semiárido nordestino.

O Brasil no circuito global da arqueologia

A descoberta paraibana representa um marco para o Brasil no cenário da arqueologia mundial. Embora sítios como a Serra da Capivara, no Piauí, já tenham revelado evidências de ocupações humanas milenares, o Serrote do Letreiro vai além, ao mostrar que os primeiros habitantes do território nacional também foram intérpretes da geologia local.

A interação simbólica entre seres humanos e pegadas de dinossauros é uma contribuição única para a compreensão de como as sociedades antigas ressignificavam os vestígios do passado profundo. Em vez de ignorar ou temer as marcas deixadas pelos dinossauros, esses povos transformaram-nas em arte, cultura e memória coletiva.

Adaptação de clickpetroleoegas.com.br

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