Eventos raros e extremamente luminosos, conhecidos como LFBots, estão desafiando teorias sobre a morte de estrelas e apontam para a existência de buracos negros de massa intermediária, uma peça-chave ainda não comprovada do quebra-cabeça cósmico.
Desde 2018, astrônomos ao redor do mundo têm registrado um tipo raro e extraordinariamente brilhante de explosão cósmica que desafia explicações tradicionais. Conhecidos como Luminous Fast Blue Optical Transients (ou LFBots), esses eventos rápidos, azuis e intensos chamaram a atenção da comunidade científica por não se encaixarem nos padrões das supernovas convencionais. Agora, uma teoria ganha força: esses fenômenos podem estar revelando a existência de buracos negros de massa intermediária, uma categoria ainda não confirmada, mas considerada essencial para entender a formação do Universo.
O primeiro caso que chamou atenção foi batizado de “The Cow” (A Vaca), um nome curioso derivado do código atribuído ao evento: AT2018cow. Detectado a cerca de 200 milhões de anos-luz da Terra, o clarão foi cerca de 100 vezes mais brilhante que uma supernova comum e desapareceu em poucos dias. Observações posteriores revelaram uma estrutura incomum e uma temperatura de aproximadamente 40.000 °C, o que conferiu à explosão sua coloração azul característica.
Desde então, cerca de uma dúzia de eventos semelhantes foi registrada, todos nomeados com apelidos inspirados em animais, como o “Koala” (2018), o “Camelo” (2020), o “Diabo da Tasmânia” (2022) e o “Finch” ou “Fawn” (2023). O mais recente, observado em 2024 e ainda sem nome oficial, pode ganhar o apelido de “Vespa”.
Desafiando a física conhecida
Inicialmente, os cientistas cogitaram que os LFBots fossem supernovas fracassadas — estrelas que, ao invés de explodir completamente, colapsam e formam buracos negros ou estrelas de nêutrons que emitem rajadas de energia para o espaço. No entanto, novas análises desafiam essa hipótese.
Pesquisadores como Zheng Cao, do Instituto de Pesquisa Espacial da Holanda, apontam para uma explicação mais intrigante: as explosões poderiam ser causadas por buracos negros de massa intermediária devorando estrelas. Simulações e observações de raios-X mostram discos de matéria ao redor das explosões, semelhantes aos que se formariam quando uma estrela é despedaçada pela gravidade de um buraco negro com entre 100 e 100.000 vezes a massa do Sol.
“Acreditamos que nosso estudo dá suporte à ideia de que AT2018cow e eventos semelhantes estejam ligados a buracos negros de massa intermediária”, afirma Cao.
O elo perdido entre os buracos negros
Até hoje, foram detectados dois tipos principais de buracos negros: os estelares, com massas entre 10 e 100 vezes a do Sol, e os supermassivos, com milhões ou bilhões de massas solares. Os intermediários seriam o elo perdido entre esses extremos e poderiam explicar, por exemplo, como os supermassivos se formaram tão rapidamente no início do Universo.
Além disso, esses buracos negros misteriosos poderiam fornecer pistas sobre a natureza da matéria escura — o componente invisível que forma grande parte do cosmos, mas cuja origem e composição seguem desconhecidas.
Próximos passos
Por serem extremamente raros e passageiros, os LFBots ainda são difíceis de estudar em profundidade. Daniel Perley, astrônomo da Liverpool John Moores University, defende que um avanço só será possível com uma amostra muito maior desses eventos. “Precisamos de dados sobre cerca de 100 LFBots para realmente entender o que está acontecendo”, diz.
A esperança é que novos telescópios espaciais, como o Ultrasat, que deve ser lançado por Israel no próximo ano, aumentem significativamente a taxa de detecção. Com um amplo campo de visão, o satélite pode identificar muitos desses clarões efêmeros. Outros equipamentos, como o Telescópio Espacial James Webb, também seriam ideais para estudar os LFBots — se os astrônomos conseguirem tempo de uso.
Até lá, o mistério persiste. O que parecia ser apenas uma curiosidade passageira pode, na verdade, esconder uma das maiores descobertas da astronomia moderna.