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Tarantino Desbloqueia ‘Kill Bill’ Total: O Que o Corte Completo Oferece?

Tarantino Desbloqueia ‘Kill Bill’ Total: O Que o Corte Completo Oferece?
Tarantino Desbloqueia ‘Kill Bill’ Total: O Que o Corte Completo Oferece?

Mais de duas décadas após o lançamento de suas duas partes, a saga de vingança de Quentin Tarantino, «Kill Bill», finalmente chega aos cinemas da América do Norte em sua versão integral: «Kill Bill: The Whole Bloody Affair». Com impressionantes quatro horas e meia de duração, este corte definitivo promete uma imersão ainda maior no universo visceral do diretor, revisitando uma obra que, para muitos fãs, sempre esteve ‘inacabada’.

A Vingança Que Demorou a Chegar

Embora Tarantino tenha integrado os dois volumes em um único filme já em 2006, essa versão foi exibida apenas em festivais como Cannes e em cinemas de sua propriedade em Los Angeles. A estreia em mais de mil telas agora marca a primeira vez que o público terá acesso amplo a essa montagem, que havia se tornado quase uma lenda urbana entre os cinéfilos.

«Kill Bill» representou um ponto de virada na carreira de Tarantino. Longe dos dramas criminais com pitadas de humor negro que o consagraram, o diretor, em parceria com Uma Thurman (a “Q & U” dos créditos), concebeu a personagem da Noiva: uma ex-assassina grávida que sobrevive a um ataque brutal no dia de seu casamento, orquestrado por seu ex-chefe e amante, Bill, e seus colegas letais. Após anos em coma, ela desperta com uma sede insaciável por vingança, mergulhando o espectador em uma homenagem explícita aos filmes de kung fu, exploitation e vingança que moldaram a juventude do cineasta.

A decisão de dividir o filme em duas partes em 2003 foi do produtor Harvey Weinstein, devido ao orçamento estourado e à duração que se aproximava das quatro horas. A estratégia se mostrou um sucesso financeiro, arrecadando US$ 330 milhões globalmente. No entanto, deixou os fãs esperando por um corte completo que, até agora, era apenas um desejo.

O Que Há de Novo (e o Que Sumiu)

Para quem espera apenas uma junção simples dos dois filmes, o corte «The Whole Bloody Affair» oferece mais do que isso – e também algumas subtrações estratégicas. Uma das mudanças mais notáveis é o reposicionamento de uma revelação crucial: a informação de que a filha da Noiva está viva, antes antecipada no final do Volume 1 como um gancho, agora é descoberta simultaneamente pela protagonista e pela audiência no terço final do filme. Isso intensifica a jornada emocional da Noiva.

O Volume 2 também perde uma breve introdução em preto e branco de Uma Thurman, um detalhe menor, mas que altera o ritmo inicial da segunda metade da saga.

Contudo, as adições são o que mais chamam atenção. A sequência animada que narra a história de origem de O-Ren Ishii (interpretada por Lucy Liu) ganha uma cena de ação extra, mostrando uma jovem O-Ren em combate. Mas o grande destaque é a icônica batalha na Casa das Folhas Azuis. Para evitar uma classificação NC-17 no lançamento original, parte da carnificina foi cortada e a cena alternava para preto e branco. Agora, ela é apresentada na íntegra, em cores vibrantes, exibindo toda a intensidade e o “spray arterial” que Tarantino originalmente imaginou. O amarelo do uniforme da Noiva, o azul das luzes e, claro, o vermelho do sangue ganham uma dimensão ainda mais poderosa com a fotografia de Robert Richardson.

O Inesperado e o Essencial

Curiosamente, uma cena deletada do DVD do Volume 2, que mostrava Bill em ação marcial, não foi reintegrada. Em seu lugar, há um capítulo bônus animado e “perdido”, criado para o jogo Fortnite. Esta sequência, que mostra Yuki, a irmã gêmea de Gogo, buscando vingança contra a Noiva, é descrita como “estranheza do motor do Fortnite” e provavelmente não será considerada essencial pelos fãs mais puristas. Sua inclusão, no entanto, reflete a natureza digressiva e expansiva da obra de Tarantino.

Apesar de alguns críticos considerarem que a trama principal de «Kill Bill» poderia ser contada em menos de 100 minutos, o diretor estava certo em resistir a cortes. São justamente os “bits” aparentemente supérfluos – a origem barroca de O-Ren, o encontro com o lendário criador de espadas, o monólogo de Bill sobre Superman – que transformam o filme de uma simples série de lutas em uma experiência grandiosa. É um brilhante híbrido entre um DJ set cinematográfico, diversos subgêneros de exploitation e um romance épico.

Mesmo que o filme funcione bem em dois volumes distintos, o corte «The Whole Bloody Affair» oferece uma oportunidade única de se imergir na sensibilidade de Tarantino e, principalmente, na performance poderosa e multifacetada de Uma Thurman. Sua capacidade de transitar da exigência física à emoção crua, especialmente quando a maternidade a impulsiona, eleva «Kill Bill» a um patamar de épico genuíno. Mais do que qualquer ajuste técnico, é a plenitude da atuação de Thurman que solidifica o legado desta obra.

Adaptação da redação do Movimento PB para artigo publicado no The Guardian.

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