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Conectividade e Conflito Urbano: Uma Análise da Infraestrutura de Telecomunicações e Energia no Brasil


João Pessoa, Paraíba – A intrincada rede de cabos e postes que compõe a infraestrutura urbana do Brasil esconde uma série de desafios complexos, com repercussões significativas no acesso à internet e na segurança pública. O Movimento PB debruça-se sobre um estudo que revela as tensões e as fragilidades do atual modelo de compartilhamento de infraestrutura entre os setores de energia elétrica e telecomunicações.


O documento em questão é de autoria de Percival Henriques de Souza. Percival é uma figura de notável engajamento público e político, reconhecido por sua vasta expertise: ele é especialista em Justiça Constitucional e Tutela Jurisdicional dos Direitos Fundamentais pela Universidade de Pisa (IT) , pesquisador pela Rede de pesquisa Teoria Crítica do Direito e De(s)colonialidade Digital , e membro titular do Conselho Nacional de Segurança Cibernética da Presidência da República. Sua influência também se estende à governança da internet no Brasil, atuando como conselheiro do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.BR) , vice-presidente do Conselho de Administração do NIC.BR , e coordenador da Câmara de Segurança Cibernética e Direitos do CGI.BR. Adicionalmente, preside a Associação Nacional para Inclusão Digital (Anid). Fora de sua atuação técnica, Percival Henriques é Secretário Estadual de Comunicação do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) na Paraíba, o que sublinha sua preocupação com a democratização do acesso e a inclusão digital como pilares essenciais de políticas públicas. Seu trabalho detalha como a gestão da infraestrutura de energia e telecomunicações enfrenta sérios impasses.


A Disparidade Regulatória e o Impacto Tarifário


A regulamentação do compartilhamento de postes, estabelecida primordialmente pela Resolução Conjunta ANEEL/ANATEL nº 004/2014, previu um valor de referência de R$ 3,19 por ponto de fixação. No entanto, observam-se cobranças que chegam a R$ 19,00, gerando receitas consideráveis que, conforme o Procedimento de Regulação Tarifária (PRORET) da ANEEL, deveriam ter 60% repassados aos consumidores de energia elétrica para garantir a modicidade tarifária. O estudo de Percival aponta que essa determinação é sistematicamente descumprida, com as distribuidoras se apropriando indevidamente da totalidade dos recursos.


As divergências entre as agências reguladoras, ANEEL e ANATEL, contribuem para esse cenário. A ANEEL, por vezes, tem privilegiado as companhias de energia, que passaram a encarar o compartilhamento como fonte de receita, enquanto a ANATEL expressa preocupação com os impactos negativos dessa postura para os milhões de brasileiros. Essa dinâmica, que pode configurar uma “captura regulatória”, impede a harmonização de interesses e a efetivação da transparência, como a pendente implementação de um cadastro público eletrônico de ocupação dos postes.


O Caso de João Pessoa: Monopólio e Ilegalidades


Em dezembro de 2022, a Prefeitura Municipal de João Pessoa homologou a CONCORRÊNCIA PÚBLICA Nº 06.002/2022, cujo objeto foi a “CONCESSÃO DE USO DO BEM PÚBLICO, A TÍTULO PRECÁRIO, DO ESPAÇO FÍSICO DOS POSTES DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA E ESPAÇO SUBTERRÂNEO NECESSÁRIO A PASSAGEM DOS CABOS DE FIBRA ÓTICA; DE USO EXCLUSIVO PARA A EXPLORAÇÃO COMERCIAL DE TRANSMISSÃO DE DADOS, VOZ E IMAGENS ATRAVÉS DA TECNOLOGIA DISPONÍVEL, PELA MAIOR CONTRAPRESTAÇÃO OFERTADA, PELO PRAZO DE 30 (TRINTA) ANOS”. Tal modelo monopolista, conforme a análise, contraria o princípio constitucional da livre concorrência (art. 170, IV, CF/88), as diretrizes do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) e as normativas de compartilhamento de infraestrutura.


O Tribunal de Contas do Estado da Paraíba (TCE-PB), em análise do Processo TC N° 09393/22, identificou graves irregularidades na Concorrência Pública Nº 06.002/2022. Essas irregularidades incluíram favorecimento à empresa vencedora, descumprimento de requisitos do edital, ausência de fundamentação legal adequada, critério de julgamento inadequado, indefinição sobre obsolescência tecnológica e falta de clareza quanto ao uso da infraestrutura. Embora a decisão de anulação tenha sido parcialmente reformada após a desistência da empresa denunciante, as irregularidades permanecem válidas e apontam para a necessidade de fiscalização contínua.


O PROCON e a “Advocacia Administrativa”


Um ponto crítico levantado pelo estudo é a atuação de órgãos públicos que deveriam defender o consumidor, como os PROCONS. O PROCON estadual, em João Pessoa, tem emitido notificações e autuações contra provedores regionais de internet que tentam operar na cidade, alegando supostas irregularidades no uso da infraestrutura pública. Essas ações, baseadas em supostas violações ao Código de Defesa do Consumidor em situações que não configuram relação de consumo, mas sim disputas comerciais entre empresas, sugerem uma “advocacia administrativa” irregular. Essa seletividade na fiscalização e a fundamentação questionável das ações indicam um desvio de finalidade institucional, que em vez de proteger o consumidor pela concorrência, atua em favor de interesses comerciais específicos.


“Cibercangaço”: O Crime no Controle da Conectividade


A fragilização dos provedores regionais, seja por regulamentação inadequada ou pela atuação enviesada de órgãos públicos, tem gerado um vácuo preocupante. Esse espaço, segundo o estudo, tem sido progressivamente ocupado por organizações criminosas. O fenômeno do “cibercangaço” descreve a expansão das atividades criminosas para o controle da infraestrutura de telecomunicações, extorquindo provedores legítimos e, em seguida, estabelecendo seus próprios serviços ilegais de internet.
Casos como o de Fortaleza, onde a Brisanet perdeu cerca de 2.000 clientes para o crime organizado, e a criação da “CVNet” no Rio de Janeiro, demonstram a seriedade do problema. As consequências são a degradação do serviço, a exclusão digital e riscos à segurança de dados dos usuários. A correlação entre a ineficácia regulatória e o avanço do crime organizado é uma das principais preocupações de Percival Henriques de Souza.


Recomendações para a Requalificação e Acesso Digno à Internet


Diante deste panorama, o estudo propõe uma série de medidas urgentes: a revisão de concessões exclusivas, o fortalecimento da coordenação entre ANEEL e ANATEL, a implementação imediata do sistema de oferta pública eletrônica, e uma investigação aprofundada dos casos de advocacia administrativa. Percival Henriques de Souza defende a criação de uma força-tarefa interinstitucional para enfrentar a captura criminosa e institucional da infraestrutura, além de um Grupo de Trabalho Multissetorial para a requalificação da infraestrutura em João Pessoa, buscando inspiração em modelos urbanos internacionais.


Para Percival Henriques de Souza, a democratização do acesso à internet é um direito fundamental, um pilar da cidadania contemporânea. A atuação dos provedores regionais é crucial nesse processo, e o desequilíbrio regulatório e a atuação do crime organizado ameaçam diretamente essa premissa. A sua visão política se alinha à necessidade de um Estado atuante e transparente para garantir que a infraestrutura digital sirva ao cidadão e não a interesses privados ou criminosos.

Para acesso à íntegra do estudo e aprofundamento nos dados apresentados, clique no link a seguir: [Acesso ao documento na íntegra ].

Da redação do Movimento PB

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