GeralMeio Ambiente

COP-30: Impasse sobre gênero e raça é superado no texto final após pressão diplomática

Negociações em Belém garantem inclusão de “mulheres de descendência africana” e barram restrições ao termo “gênero” propostas por alas conservadoras.

As negociações finais da Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP-30), realizada em Belém, conseguiram superar divergências significativas sobre os termos “gênero” e “afrodescendente” no texto final do acordo. Na madrugada desta sexta-feira (21), os rascunhos finais confirmaram a exclusão de notas de rodapé restritivas e a inclusão histórica do termo “mulheres de descendência africana”.

O impasse foi gerado inicialmente por um bloco formado por Paraguai, Argentina, Irã e o Vaticano, que exigiam uma nota de rodapé no Plano de Ação de Gênero. O grupo demandava que qualquer menção a “gênero” fosse interpretada exclusivamente como referência aos sexos biológicos masculino e feminino, uma manobra para excluir a comunidade LGBTQIA+ das políticas climáticas.

Em outra frente de tensão, nações desenvolvidas como Reino Unido, Austrália e os membros da União Europeia resistiam à inclusão da palavra “afrodescendente”. A justificativa era de que a menção específica poderia abrir precedentes para a inserção de outros grupos vulnerabilizados no texto. Observadores internacionais apontam que a delegação brasileira realizou esforços decisivos para mediar o conflito e garantir a redação inclusiva.

Justiça climática e impacto social

O Plano de Ação de Gênero, que está sendo atualizado em Belém para o ciclo de 2026 a 2034, parte da premissa científica de que os impactos das mudanças climáticas não são neutros. Mulheres pobres e negras são as primeiras a sofrer com secas, enchentes e calor extremo. Dados da ONU indicam que a crise climática pode empurrar mais 158 milhões de mulheres para a pobreza até 2050, com impacto severo na África Subsaariana.

A ofensiva contra a terminologia de gênero reflete um movimento geopolítico que transcende a pauta ambiental. Sonia Correa, coordenadora do Observatório de Sexualidade e Política, avalia que o Vaticano e governos ultraconservadores exercem forte influência nos bastidores, mesmo aqueles que não têm voto direto. “Há muito mais vigor na ofensiva… influenciada por forças como a Argentina de Javier Milei e os Estados Unidos de Donald Trump”, analisa a especialista.

A “COP das Mulheres”

Para a organização Geledés – Instituto da Mulher Negra, a resistência inicial do bloco europeu ao termo “afrodescendente” soou como uma manobra “colonialista e regressiva”. A inclusão final do termo é vista como essencial para legitimar a justiça climática no Sul Global.

Michelle Ferretti, do Instituto Alzira, define o desfecho como uma “chance histórica” de consagrar a conferência na Amazônia também como a “COP das mulheres”. Segundo ela, não é possível falar em justiça climática sem reconhecer o peso histórico do racismo, do colonialismo e da escravidão, exigindo medidas reparatórias concretas.

Adaptado de O Estado de S. Paulo, pela redação do Movimento PB. [GEMINI-MPB-22112025-F8E3A1-V18.2]