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Robert Harris compara eleição papal ao reality “The Traitors” e sugere que modelo inspire partidos políticos

Por Mark Easton da BBC e adaptado para o, português por Movimento PB

O romancista britânico Robert Harris, autor do livro Conclave, comparou o processo de escolha do novo Papa ao popular reality show The Traitors, destacando as semelhanças na dinâmica de grupo e no fator surpresa que marcam ambos os formatos. Em entrevista à BBC às vésperas da eleição para substituir o Papa Francisco, Harris afirmou que o sistema da Igreja Católica, embora antigo e secreto, pode oferecer lições valiosas à política contemporânea.

Lançado em 2016, o romance Conclave explora os bastidores da escolha de um novo pontífice. A obra foi adaptada para o cinema em 2023, tornando-se um filme premiado. Segundo o autor, o formato da votação entre cardeais — realizada em sigilo absoluto dentro da Capela Sistina — se assemelha à lógica de programas como The Traitors, em que participantes “fiéis” precisam identificar os “traidores” entre eles. “De repente, todos se voltam para um nome — e você nem sempre entende por quê. Mas acontece. É uma dinâmica estranha, e o conclave também opera assim, o que explica por que tantas vezes o resultado surpreende”, comentou Harris.

Além de sua analogia com o entretenimento, Harris defendeu o conclave como um método eficiente de escolha de liderança. “É um dispositivo notavelmente eficaz para encontrar a pessoa certa. Tranca-se a porta e ninguém sai até que haja um resultado — isso concentra as mentes”, argumentou. Para ele, partidos políticos deveriam considerar algo semelhante. O autor criticou o modelo adotado por legendas do Reino Unido, que ampliaram o voto a toda a base de filiados. “Isso não tem produzido bons líderes”, observou. Ele sugere que a escolha recaia sobre um grupo menor de pessoas que conhecem de perto os candidatos. “Se olharmos para os últimos papas, veremos que a seleção tem sido razoavelmente acertada.”

Durante o processo de pesquisa para o livro, Harris teve acesso a áreas do Vaticano normalmente fechadas ao público. Ele contou que pôde caminhar pelo corredor que leva à sacada onde o novo Papa se apresenta à multidão na Praça de São Pedro. “Foi um momento de tirar o fôlego”, descreveu.

Contudo, o autor também não poupou críticas à exclusão das mulheres do processo decisório na Igreja. “Pode uma religião sofisticada, com uma base de fiéis tão grande, continuar relegando às mulheres um papel tão secundário e humilhante?”, questionou. “Cristo realmente desejaria que apenas homens propagassem sua palavra?” Para dar voz feminina à sua história, Harris criou a personagem de Irmã Agnes, uma freira que desempenha papel crucial no romance. “A única maneira de inserir uma mulher no conclave era por meio das freiras que servem as refeições, limpam os quartos e mantêm o local funcionando. Quis que elas fossem parte da narrativa.”

Ao final da entrevista, Harris refletiu sobre a força dramática do conclave, que considera comparável à leitura de um testamento. “É espiritual, humano e político — tudo entrelaçado. Um verdadeiro tesouro narrativo.” O autor também revelou que, após a publicação do livro, o cardeal Cormac Murphy O’Connor solicitou uma cópia traduzida para o italiano, que seria entregue ao Papa Francisco. “Entreguei o livro, ele disse que a tradução parecia boa… Mas não sei se o Papa chegou a ler. Se leu, não me contou nada.”

A eleição para escolha do novo Papa começa na próxima semana e, como sempre, será acompanhada de perto por milhões de fiéis em todo o mundo — com olhos atentos à fumaça que sairá da Capela Sistina: preta enquanto não houver consenso; branca quando o novo líder da Igreja Católica for escolhido.


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