Diário de soldado norte-coreano morto na Ucrânia expõe tática sacrificial contra drones e reflexões pessoais, enquanto captura de dois militares vivos amplia tensões no conflito.
Um diário encontrado por forças especiais ucranianas no campo de batalha abriu uma janela rara para as estratégias e os sentimentos de soldados norte-coreanos lutando ao lado da Rússia. Pertencente a Gyeong Hong Jong, morto em combate em dezembro passado, o documento foi descoberto em meio ao conflito na região de Kursk e traz detalhes que misturam táticas militares simples com reflexões pessoais, jogando luz sobre a participação de Pyongyang na guerra.


O achado ganhou ainda mais peso com a captura inédita de dois soldados norte-coreanos vivos pela Ucrânia, anunciada recentemente pelo presidente Volodymyr Zelensky. Esses prisioneiros, feridos e agora sob interrogatório em Kiev, marcam um novo capítulo no conflito, enquanto o diário de Jong oferece pistas sobre como esses militares operam. Um dos trechos mais chocantes é um desenho que mostra uma tática para enfrentar drones ucranianos: um soldado serve de “isca”, posicionando-se a sete metros do aparelho, enquanto dois companheiros, a 10 ou 12 metros, tentam abatê-lo com tiros precisos. A estratégia expõe uma lógica de sacrifício que impressiona pela frieza.
Além disso, o diário descreve formas de lidar com ataques de artilharia. Jong anotou que os soldados deveriam se espalhar em pequenos grupos e se abrigar em áreas já bombardeadas, apostando que elas não seriam alvos novamente. Essas táticas, embora rudimentares, mostram uma tentativa de adaptação a um cenário de guerra moderno, onde drones e bombardeios dominam — algo para o qual os norte-coreanos, segundo relatos, não estavam bem preparados.
Fora das estratégias, o texto também revela o lado pessoal do soldado. Jong confessou ter roubado itens dos aliados russos para vender, sem dizer o quê. Após ser flagrado, ele prometeu mudar: “Não vou mais mexer nas coisas dos outros. Vou avançar na linha de frente e destruir o inimigo”. Ele também escreveu sobre sua lealdade a Kim Jong Un e a saudade de casa, mencionando até um aniversário celebrado com um amigo no front. Esses registros humanizam um combatente preso entre a doutrinação e a dura realidade da guerra.
A participação norte-coreana, estimada em cerca de 12 mil soldados enviados a Kursk desde outubro, segue sem confirmação oficial de Moscou ou Pyongyang. Mesmo assim, a Ucrânia insiste em expor essa aliança, usando fotos, vídeos e agora o diário como provas. Inteligências ocidentais e sul-coreanas respaldam as alegações, apontando que pelo menos 4 mil norte-coreanos já morreram ou se feriram. Enquanto isso, o conflito ganha contornos geopolíticos maiores, com a Rússia supostamente oferecendo tecnologia e combustível a Pyongyang em troca de tropas e armas.
O diário de Gyeong Hong Jong, traduzido em parte pelo Wall Street Journal, não é só um registro de guerra, mas um testemunho de como esses soldados vivem — e morrem — longe de casa, numa colaboração silenciosa que está mudando o rumo da guerra no leste europeu.
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Texto adaptado do site Xataka Espanha e revisado pela nossa redação.