Gavião aprende a usar semáforo e trânsito para fazer emboscadas em cidade dos EUA

Estudo revela comportamento inteligente e inédito de ave de rapina que associa sinais sonoros à melhor hora para atacar
Um gavião-galinha (Accipiter cooperi) foi flagrado utilizando sinais de trânsito como ferramenta de caça em um cruzamento urbano de West Orange, em Nova Jersey, nos Estados Unidos. O comportamento, descrito por pesquisadores na revista Frontiers in Ethology, revela uma estratégia altamente sofisticada: a ave espera o sinal vermelho e usa os carros parados como camuflagem para se aproximar de suas presas, geralmente pequenos pássaros alimentando-se nas calçadas.
Caça com planejamento: trânsito como aliado
Conhecido por emboscadas bem planejadas, o gavião-galinha demonstrou compreender os padrões de funcionamento do trânsito urbano. Durante 18 dias úteis do inverno, o ecologista comportamental Vladimir Dinets, da Universidade do Tennessee, acompanhou a ave por 12 horas diárias, documentando seis tentativas de ataque — todas realizadas entre 7h30 e 9h da manhã, horário de pico no tráfego local.
A tática do gavião consistia em aguardar, posicionado em uma árvore em frente à casa número 11, até que o som do sinal para pedestres indicasse o fechamento do semáforo. Com os carros parados ao longo da rua — especialmente na altura da casa 8 — ele se movia voando baixo até uma nova posição em frente à casa 1, completamente escondido das presas que se concentravam na calçada da casa 2, onde moradores costumavam deixar migalhas de pão.
A barreira visual formada pelos carros estacionados era essencial para a aproximação furtiva. Ao alcançar a nova posição, o gavião atacava com precisão. Das seis investidas observadas, duas resultaram em capturas bem-sucedidas: um pardal (Passer) e uma rola-carpideira (Zenaida macroura).
Capacidade cognitiva surpreende cientistas
A precisão do comportamento — sempre iniciando o movimento com o mesmo som de semáforo e em horários consistentes — levou os pesquisadores a concluir que não se tratava de coincidência. Segundo Dinets, a ave demonstrou ter um “mapa mental” do ambiente urbano, com associações claras entre estímulos auditivos e oportunidades de caça.
A sofisticação dessa estratégia sugere que o gavião não apenas se adaptou ao ambiente urbano, mas incorporou elementos humanos em seu processo de tomada de decisão. “Esse comportamento é um exemplo impressionante de inteligência animal, capaz de integrar estímulos visuais e sonoros complexos para maximizar o sucesso de uma emboscada”, afirmou o pesquisador.
O padrão se repetiu no inverno seguinte, possivelmente com o mesmo animal, embora não tenha sido possível confirmá-lo. A ausência do gavião nos finais de semana, quando o tráfego é menor, reforça a hipótese de que o animal ajusta suas ações ao fluxo de veículos.
Adaptação urbana e inteligência animal
A descoberta amplia o entendimento sobre como aves de rapina podem não apenas sobreviver, mas explorar com eficiência ambientes urbanos. O uso deliberado do trânsito como cobertura demonstra um nível de plasticidade comportamental antes não observado em gaviões-galinha. Embora já se soubesse que essas aves se adaptavam a telhados, janelas e vielas para caçar, o uso de semáforos e do som urbano como ferramenta é inédito.
Pesquisas anteriores já mostraram, por exemplo, que corvos deixam alimentos com cascas duras nas ruas para que carros os quebrem, mas o caso do gavião-galinha leva a adaptação urbana a um novo patamar.
O estudo indica que, mesmo diante das dificuldades impostas pela urbanização, algumas espécies não apenas resistem, mas evoluem em seus comportamentos. Em vez de fugir do caos urbano, o gavião o transformou em vantagem estratégica.
Com informações da Frontiers in Ethology e Revista Galileu.