O brasileiro que inventou o identificador de chamadas — e perdeu a patente para uma multinacional

Em uma época em que os celulares revelam automaticamente quem está ligando, poucos sabem que essa tecnologia tem origem brasileira. E mais: foi criada por um engenheiro mineiro que morreu sem jamais receber o reconhecimento ou os royalties por sua invenção. Trata-se de Nélio José Nicolai, o criador do identificador de chamadas — conhecido por muitos como “bina”.

O nascimento do “bina”

A ideia surgiu em 1980, quando Nicolai trabalhava na Telebrasília e buscava uma forma de evitar os trotes telefônicos, comuns na época. Foi então que desenvolveu um dispositivo capaz de captar o número do originador de uma chamada antes mesmo de o telefone tocar. Batizado de “bina” — sigla para “B Identifica Número A” —, o aparelho foi o primeiro protótipo funcional do que hoje conhecemos como identificador de chamadas.

Nélio registrou sua invenção no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) em 1982, sob o número PI 820.6767. A tecnologia era inovadora e prometia transformar a telefonia no Brasil — e no mundo. Mas, mesmo com o registro formal, sua trajetória como inventor foi marcada por uma luta desigual.

A invasão das multinacionais e a batalha judicial

Com a popularização da telefonia, grandes empresas como Siemens, Ericsson e Telemar (atual Oi) passaram a incluir a função de identificador de chamadas em seus equipamentos e serviços, sem qualquer autorização do inventor. Nicolai alegou, ao longo de décadas, que sua patente estava sendo utilizada sem pagamento de royalties. Entrou com diversas ações na Justiça, buscando o reconhecimento de seus direitos.

Apesar de sua perseverança, o inventor jamais conseguiu vencer as gigantes do setor. Um parecer da Anatel, em 2004, chegou a reconhecer a importância da invenção, mas não resultou em indenizações nem em qualquer tipo de reparação.

O fim amargo de um gênio brasileiro

A patente do “bina” expirou oficialmente em 2012. Cinco anos depois, em 2017, Nélio Nicolai faleceu aos 72 anos, sem jamais ter recebido qualquer compensação financeira por sua criação — uma tecnologia que se espalhou por todo o planeta e é utilizada, até hoje, por praticamente todos os sistemas de telefonia fixa e móvel.

Ao longo da vida, ele deu entrevistas demonstrando frustração e indignação com o descaso das autoridades e o silêncio das empresas que lucraram com sua ideia. Foi apelidado de “pai do bina” por veículos como o Fantástico, o jornal O Globo e o Estadão. Mas o título simbólico nunca se traduziu em justiça.

Um legado invisível, mas presente

Mesmo com os avanços da tecnologia e a ascensão dos smartphones, a lógica por trás do identificador de chamadas segue viva. O sistema de Caller ID, presente em quase todos os aparelhos modernos, é baseado na mesma premissa criada por Nicolai nos anos 1980.

A ironia é que, em muitos países, o crédito pela invenção ainda é atribuído a corporações estrangeiras, ignorando o pioneirismo brasileiro.

Uma história que não pode se repetir

O caso de Nélio Nicolai é emblemático: um retrato de como o Brasil muitas vezes trata seus inventores e talentos criativos. A combinação de burocracia, negligência e desigualdade de forças frente a grandes empresas transformou uma genialidade nacional em uma tragédia pessoal.

Sua história deveria servir de alerta. Em um país com tanto potencial inovador, proteger a propriedade intelectual e valorizar seus criadores não é apenas uma questão de justiça — é também uma estratégia de futuro.

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