Rabiscar o invisível: Wagner Sales e o chamado para viver a arte fora das telas

Por Movimento PB – Com informações de Diego Barbosa do Diário do Nordeste

Em tempos de olhos viciados em telas e dedos programados para deslizar sem rumo por feeds infinitos, Wagner Sales propõe uma revolução silenciosa — feita de lápis, papel e coragem. Mineiro de Itajubá e residente em Fortaleza, ele acredita que desenhar é mais do que uma técnica: é um grito por presença, uma forma de resistir à passividade digital e reconectar-se com o que pulsa dentro.

“Só impressora faz desenho pronto”, ele diz. “Gente que é gente rabisca, erra, apaga e refaz.” Com essa filosofia, Wagner percorre escolas, lares e espaços alternativos levando o convite: largue um pouco a tela, reconquiste o papel. Saia da condição de espectador da vida e protagonize com traços, cores e alma.

Alfabetizado aos 15 anos, depois de passar por escolas especiais e enfrentar desafios cognitivos, Wagner viu no desenho mais que refúgio — viu sobrevivência. Enquanto o mundo parecia não saber onde encaixá-lo, ele desenhava. Não por passatempo, mas por necessidade. Era ali, nos riscos aparentemente aleatórios, que ele encontrava sentido, identidade e futuro.

“Desenhar foi minha válvula de escape para me entender e me aceitar. Aos poucos, percebi que era por onde eu ganhava voz. Quando a arte me olhou de volta, tudo mudou.” A mudança, de fato, foi profunda. Do garoto visto apenas como “o que desenha bem” na escola, Wagner se transformou em ilustrador com mais de 150 projetos assinados, alguns reconhecidos até no exterior. Hoje, ele soma mais de 40 pinturas, cerca de 30 desenhos realistas, e um propósito: ensinar outros a também se reconhecerem criadores.

“Por mais que eu veja alguns erros, é importante não apagar do aluno a paixão por desenhar”

Entre seus alunos, há crianças, adolescentes e adultos. Alguns buscam técnica, outros buscam cura. Mas todos, em alguma medida, querem se reaproximar de algo perdido — o gesto de criar com as mãos, a presença do erro como aprendizado, o silêncio necessário para que a intuição se manifeste. Wagner ensina tudo isso não apenas com didática, mas com escuta e empatia. “Corrijo quando é preciso, mas jamais apago a paixão de alguém por desenhar. Todo caminho criativo tem seu tempo. Meu papel é proteger esse tempo.”

Sua própria trajetória mostra que a arte não precisa de grandes estruturas para florescer. Basta que alguém acredite — como Tatiana Zylberberg acreditou. A jovem estudante de Educação Física que escreveu um livro e o convidou para ilustrá-lo mudou tudo. Mais tarde, ela também se tornaria sua esposa, em uma história que começou com uma mensagem no Orkut e se transformou em parceria de vida e de criação.

O que Wagner defende é um resgate urgente. Em vez de aceitar a passividade das telas, ele sugere uma escolha: ser criador do próprio mundo. Um simples lápis pode ser a chave para isso. “A arte nos devolve a presença, nos faz ver beleza no erro, força no detalhe. Ela exige de nós algo que a tela não pede: entrega.”

E é esse tipo de entrega que ele quer inspirar em cada traço ensinado, em cada desenho revelado. Porque, no fundo, cada ser humano carrega um artista adormecido, esperando apenas que lhe deem papel e liberdade. Ao convidar as pessoas a desenharem, Wagner não está falando só de técnica — está falando de viver com mais atenção, mais sensibilidade, mais verdade.

Ele sabe que não vai converter todos de imediato, mas está acostumado com batalhas longas. Como alguém que venceu o silêncio com o som das cores, sabe que é possível, sim, sair das sombras da tela e ocupar o centro do palco. Afinal, viver também é um ato artístico.


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