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STF acumula 5 votos a favor da quebra de sigilo de buscas na internet em investigações criminais

STF acumula 5 votos a favor da quebra de sigilo de buscas na internet em investigações criminais

O Supremo Tribunal Federal (STF) avança em um julgamento de repercussão nacional ao formar placar de 5 votos favoráveis contra 2 pela possibilidade de quebra de sigilo de dados de buscas na internet, em medida que pode alterar o equilíbrio entre privacidade e investigação criminal. O caso, com repercussão geral reconhecida, serve de precedente para processos semelhantes e surgiu de um recurso do Google contra ordem judicial no âmbito das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, ocorrido em 14 de março de 2018, no Rio de Janeiro. Nesta quinta-feira, 25 de setembro de 2025, o ministro Dias Toffoli pediu vista, suspendendo a sessão e adiando a conclusão do debate, com votos pendentes de Cármen Lúcia e Luiz Fux.

O contexto do julgamento: de Marielle ao equilíbrio entre direitos

O Recurso Extraordinário (RE) 1.301.250 chegou ao STF após o Superior Tribunal de Justiça (STJ) manter decisão da Justiça do Rio de Janeiro que determinou ao Google a entrega de protocolos de IP ou identificadores de dispositivos (“Device Ids”) de usuários que, entre 10 e 14 de março de 2018, pesquisaram termos como “Marielle Franco”, “vereadora Marielle”, “agenda vereadora Marielle”, “Casa das Pretas” – local do último compromisso da parlamentar – ou “Rua dos Inválidos, 122”. A medida, decretada em primeira instância, visava identificar potenciais envolvidos no planejamento do crime, que chocou o país pela brutalidade e pelo simbolismo político de Marielle, defensora de direitos humanos e das favelas cariocas.

O STJ considerou a ordem “devidamente fundamentada e não desproporcional”, limitando-a a uma região geográfica específica e ao período de 96 horas anterior ao assassinato, com garantia de descarte de dados não relevantes. Em maio de 2025, a Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciou os supostos executores, avançando na elucidação do caso após anos de impunidade. No entanto, o Google recorreu ao Supremo, argumentando que a “busca reversa” – varredura generalizada sem identificação prévia de suspeitos – viola o artigo 5º, inciso XII, da Constituição Federal, que protege a inviolabilidade de comunicações e dados pessoais, podendo atingir inocentes interessados em uma figura pública.

O voto da relatora e a divergência que define o rumo

A relatora original, ministra Rosa Weber, aposentada em setembro de 2023, votou contra a medida em sessão virtual, considerando-a inconstitucional por sua amplitude e risco à privacidade coletiva. Seu voto foi seguido apenas pelo ministro André Mendonça, que enfatizou a necessidade de individualização para preservar direitos fundamentais. Em divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes, relator atual, a tese favorável defende que, em crimes graves como homicídios de repercussão internacional, a quebra pode ser autorizada se fundamentada, proporcional e temporária, alinhando-se à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e ao Marco Civil da Internet.

Nesta quarta-feira, 24, os ministros Gilmar Mendes e Kassio Nunes Marques acompanharam Moraes, estabelecendo critérios como delimitação temporal, geográfica e temática das buscas, além de supervisão judicial para descarte de dados irrelevantes. Mendes destacou que “a investigação não pode ser cerceada por formalismos excessivos em casos de tamanha gravidade”, enquanto Nunes Marques ponderou sobre o equilíbrio entre eficiência investigativa e proteção de dados. Na quinta, o ministro Edson Fachin, em voto detalhado, alinhou-se à divergência, afirmando que os requisitos constitucionais foram cumpridos na ordem do caso Marielle, reforçando o placar para 5 a 2 antes do pedido de vista de Toffoli.

Argumentos do Google e implicações para a privacidade digital

A gigante de tecnologia sustenta que a medida é “genérica e desproporcional”, podendo estender-se a qualquer tema público e ferir a inocência presumida. “Varreduras em históricos de milhões de usuários violam a privacidade sem nexo causal direto com o crime”, argumenta a empresa em petição, citando o extenso período de buscas e a popularidade dos termos. Especialistas em direito digital alertam para precedentes perigosos, como a potencial “vigilância em massa” em eleições ou protestos, mas defensores da tese favorável, como Moraes, contrapõem que o Judiciário pode modular limites para evitar abusos, inspirando-se em jurisprudência europeia do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE).

No Brasil, onde o crime de Marielle expôs falhas na segurança de ativistas, o julgamento transcende o caso específico. Com repercussão geral, a decisão influenciará investigações futuras, como as do 8 de janeiro ou feminicídios, equilibrando o artigo 5º, X (intimidade) e LVI (provas ilícitas) da Constituição. Flávio Dino, substituto de Weber, e Luís Roberto Barroso, impedido, não votam, deixando o desfecho para os ministros restantes.

Embora o caso seja carioca, suas ramificações tocam o Nordeste, onde investigações de crimes políticos e ambientais frequentemente dependem de dados digitais.

O julgamento, suspenso, deve retornar em outubro, possivelmente definindo se o avanço investigativo prevalece sobre a privacidade absoluta – um dilema que reflete as tensões da era digital no Brasil.


“A investigação não pode ser cerceada por formalismos excessivos em casos de tamanha gravidade, mas deve ser proporcional e fundamentada para preservar a democracia.” – Ministro Gilmar Mendes, STF


Da redação com informações de Ascom/STF [GRK-XAI-28092025-2340-V1G]


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