BRICS no Rio Reafirma Rejeição ao Protecionismo de Trump
O Rio de Janeiro se tornou o palco da Cúpula do BRICS neste domingo e segunda-feira, um encontro crucial para o grupo de 11 nações que, juntas, representam quase metade da população mundial e cerca de 40% do PIB global. Liderada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a reunião ocorre sem a presença física do presidente chinês Xi Jinping e com a participação online do líder russo Vladimir Putin. O grande objetivo é emitir uma rejeição clara às políticas de tarifas e ao protecionismo defendidos por Donald Trump, embora os países-membros evitem citar explicitamente o ex-presidente americano.
A pauta do encontro ganhou ainda mais relevância após o presidente Trump alertar sobre a iminente implementação de suas anunciadas tarifas a aliados comerciais dos Estados Unidos. Em resposta, o BRICS se prepara para apresentar uma frente comum contra essas medidas unilaterais. “Expressamos nossa séria preocupação com o aumento de medidas tarifárias e não tarifárias unilaterais que distorcem o comércio e são inconsistentes com as regras da Organização Mundial do Comércio”, afirma o projeto de declaração final, ao qual a agência AFP teve acesso. O presidente Lula já havia antecipado o tom da cúpula no sábado, declarando: “Diante do ressurgimento do protecionismo, cabe às nações emergentes defender o regime multilateral de comércio e reformar a arquitetura financeira internacional.” A cautela, contudo, é evidente: o texto final não deve fazer menção explícita a Trump, uma vez que países como a China mantêm negociações bilaterais sensíveis com os EUA sobre disputas tarifárias.
Dólar em Pauta e o Consenso Geopolítico Delicado
Paralelamente às discussões sobre protecionismo, a ideia de impulsionar uma moeda alternativa ao dólar para o comércio entre os membros do BRICS, um apelo frequente de Lula, não deve avançar nesta cúpula. Lula havia argumentado durante a semana que, “se a gente não encontrar uma nova fórmula, a gente vai terminar o século XXI igual a gente começou o século XX”, referindo-se à hegemonia do dólar. No entanto, a própria presidente do banco do BRICS, a ex-presidente brasileira Dilma Rousseff, descartou a viabilidade imediata da proposta. “Hoje não tem ninguém querendo assumir o lugar dos Estados Unidos (…) Como é que você fornece uma moeda hegemônica para o resto do mundo?”, questionou Dilma no sábado, acrescentando que não vê “possibilidade de que isso esteja ocorrendo”.
Um dos temas mais divisivos, a escalada bélica no Oriente Médio, conseguiu alcançar um consenso entre os negociadores no sábado. O Irã, que se juntou ao grupo em 2023, aspirava a um tom mais incisivo do BRICS sobre o conflito na região. No entanto, a declaração final dos líderes deve manter a “mesma mensagem” que o grupo emitiu em junho: uma “profunda preocupação” com os bombardeios contra o Irã, sem mencionar diretamente Israel e os Estados Unidos. Essa posição reflete a delicadeza de equilibrar os interesses e as relações diplomáticas dos diversos membros, mesmo diante de um conflito de grande repercussão global.
A ofensiva israelense sem precedentes contra o Irã, iniciada em 13 de junho sob a acusação de desenvolvimento de armamento nuclear (negado por Teerã), e a união dos Estados Unidos à ofensiva com bombardeios contra instalações nucleares iranianas, elevou a tensão. O Irã respondeu com ataques a Israel e a uma base americana no Catar, antes que Trump anunciasse uma trégua. A capacidade do BRICS de encontrar um terreno comum em um tema tão sensível é um indicativo de seu papel crescente nas discussões geopolíticas.
Ausências Notáveis e a Ampla Agenda do BRICS
Esta cúpula marca a primeira vez desde 2012 que o presidente chinês Xi Jinping não comparece presencialmente a um encontro do BRICS. Além dele, o presidente iraniano Masud Pezeshkian também não viajou ao Rio. A ausência do presidente russo Vladimir Putin, que enfrenta um mandado de prisão internacional por supostos crimes de guerra na Ucrânia, já era esperada, com sua participação confirmada por videoconferência. As ausências, embora pontuais, não diminuem a importância da agenda do grupo.
Além das questões comerciais e geopolíticas, o BRICS divulgará declarações importantes sobre mudanças climáticas – um tema de particular relevância para o Brasil, que sediará a COP30 em Belém no final do ano. A agenda também inclui debates sobre inteligência artificial e cooperação na área da saúde, refletindo a amplitude dos desafios e oportunidades que o bloco pretende abordar. O grupo, que teve sua fundação em 2009, foi recentemente expandido com a incorporação da Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia, Indonésia e Irã, uma medida que visa reforçar a voz e a influência do chamado Sul Global no cenário internacional.
Para garantir a segurança do evento no Rio de Janeiro, as Forças Armadas brasileiras mobilizaram mais de 20.000 militares, incluindo o uso de caças com mísseis para controle do espaço aéreo. Essa robusta operação de segurança sublinha a importância estratégica da cúpula e o status do Rio de Janeiro como palco de grandes eventos internacionais. A reunião do BRICS, portanto, transcende a mera formalidade, configurando-se como um momento decisivo para a discussão de temas que moldarão as relações globais nas próximas décadas.
Da redação com informações de AFP [GM-20250706-1223]