Manobras digitais e verbetes editados: opositores de Francisco tentam influenciar próximo conclave
Com a morte do Papa Francisco, cresce a atenção sobre os bastidores do conclave que definirá seu sucessor. Reportagem do Corriere della Sera revela que grupos ligados à ala ultraconservadora da Igreja Católica, especialmente nos EUA, articulam ações online para enfraquecer a imagem de cardeais mais alinhados ao pontífice falecido, inclusive com alterações na Wikipédia e disseminação de boatos.
Texto reescrito:
Desde antes da popularização da internet, setores da Igreja Católica já buscavam interferir nas decisões do conclave, especialmente para minar candidaturas consideradas indesejadas. No entanto, segundo o jornal italiano Corriere della Sera, com as redes sociais e o anonimato digital, essas ações se tornaram mais evasivas e difíceis de rastrear.
Em 2013, quando o argentino Jorge Mario Bergoglio era cotado para suceder Bento XVI, adversários espalharam boatos de que ele teria apenas um pulmão. Durante o conclave, alguns cardeais chegaram a questioná-lo. Bergoglio precisou explicar que, aos 21 anos, havia perdido apenas o lobo superior do pulmão direito devido a cistos, e que o restante do órgão havia se adaptado normalmente.
Hoje, as campanhas de desinformação são ainda mais sofisticadas. Um candidato ao papado pode ser alvo de rumores envolvendo saúde debilitada ou suposto envolvimento em escândalos de abuso. O pontificado de Francisco, marcado por um viés reformista e de aproximação com os mais pobres, enfrentou forte resistência organizada, especialmente da ala conservadora norte-americana.
O jornalista francês Nicolas Senèze documentou essas articulações em seu livro Como a América quis mudar o Papa. Nele, relata a existência de uma operação chamada Red Hat Report, voltada à elaboração de dossiês sobre cada cardeal com direito a voto no conclave. O projeto previa um orçamento de US$ 1 milhão para produzir os relatórios em dois anos, focando em denúncias de corrupção, abuso e outras acusações.
Entre as estratégias do grupo, destacam-se alterações em perfis da Wikipédia para prejudicar certos cardeais. Segundo o Corriere, os articuladores chegaram a afirmar que, se tivessem feito isso antes, Bergoglio talvez não teria sido eleito Papa.
Outro movimento citado foi a disseminação de um dossiê escrito por Carlo Maria Viganò — ex-núncio que se tornou uma das vozes mais radicais contra Francisco, chegando a chamá-lo de “servo de Satanás”. Viganò foi excomungado em 2024 por cisma. O dossiê foi amplificado por veículos ligados à rede católica EWTN, dos Estados Unidos, epicentro midiático da oposição ao Vaticano.
Nos últimos anos, o Vaticano fortaleceu a presença online com conteúdos oficiais no Vaticannews.va e Vatican.va, como resposta ao temor de interferências digitais no processo que precede o conclave. Durante a votação, os cardeais ficam isolados e sem acesso a dispositivos eletrônicos, mas as campanhas informativas e ataques digitais costumam ocorrer nos dias que antecedem a escolha do novo Papa.