Do sonho ao pesadelo no Camboja: arquiteta que vivia na PB é vítima de tráfico humano e luta pela vida em prisão superlotada
Atraída por falsa promessa de emprego, Daniela Marys foi presa por tráfico de drogas após se negar a participar de golpes; mãe, em João Pessoa, denuncia extorsão e descaso diplomático.
O que começou como uma oportunidade de trabalho internacional terminou em um pesadelo kafkiano. A arquiteta Daniela Marys de Oliveira, de 35 anos, que vivia em João Pessoa, está presa desde março em uma penitenciária superlotada no Camboja. Segundo a família, ela foi vítima de tráfico humano e manipulação criminosa após aceitar uma proposta de emprego que prometia estabilidade e retorno ao Brasil. Hoje, debilitada e isolada, luta para provar sua inocência enquanto o caso expõe a fragilidade da proteção consular brasileira em países do Sudeste Asiático.
Falsa promessa e armadilha digital
Daniela foi recrutada por supostos empregadores que ofereciam uma vaga de telemarketing internacional com contrato de um ano. A proposta parecia segura, mas ao chegar ao Camboja, a arquiteta descobriu que o trabalho envolvia a aplicação de golpes pela internet com uso de identidades falsas. Ao se recusar a participar das fraudes, passou a ser ameaçada. Pouco tempo depois, foi presa sob a acusação de tráfico de drogas — crime que, segundo a mãe, foi forjado pelos próprios aliciadores.
“Ela me ligou do telefone de um policial dizendo que estava presa. Disseram que encontraram três cápsulas de droga no banheiro e a acusaram de tráfico. Ela implorou para fazer um teste toxicológico, mas nunca deixaram”, relatou Myriam Marys, mãe de Daniela. Segundo ela, as drogas foram plantadas como retaliação. Desde então, Daniela vive em uma cela com cerca de 90 mulheres, sem condições sanitárias mínimas e com acesso limitado à saúde.
Negligência diplomática e extorsão familiar
A mãe, que mora em João Pessoa, afirma enfrentar silêncio e lentidão das autoridades. “O médico da prisão disse que ela precisava de exames fora, mas demoraram quase 20 dias para levá-la. A embaixada não faz nada. Dizem que o governo do Camboja não permite contato”, denunciou. A situação se agravou quando a família passou a ser vítima de golpes de extorsão: criminosos usaram o celular de Daniela para exigir transferências sob o pretexto de multas e custos de liberação.
“Disseram que ela tinha sido demitida e precisava pagar uma multa de US$ 4 mil. Nós acreditamos, achando que era verdade, e acabamos transferindo R$ 27 mil”, contou Myriam, emocionada. Só depois descobriram que Daniela já estava detida.
Julgamento e esperança de repatriação
O Ministério das Relações Exteriores confirmou que acompanha o caso por meio da embaixada brasileira na Tailândia, responsável pelas questões diplomáticas do Camboja. Entretanto, a família afirma que a comunicação tem sido precária e que não há garantias de defesa efetiva antes do julgamento, marcado para o próximo dia 23 de outubro.
Enquanto aguarda o desfecho, os parentes organizam uma vaquinha online para custear advogados locais e tentar viabilizar uma eventual repatriação. “Só queremos que ela volte viva”, diz Myriam, resumindo a luta que já dura sete meses.
Tráfico humano e vulnerabilidade de brasileiros
O caso de Daniela Marys é mais do que um drama pessoal — é um retrato cruel da vulnerabilidade de brasileiros diante das redes internacionais de tráfico humano, que exploram sonhos de ascensão profissional e prometem estabilidade fora do país. A história também reacende o debate sobre a necessidade de ações diplomáticas mais firmes e mecanismos de proteção preventiva para cidadãos brasileiros no exterior.
Enquanto isso, em João Pessoa, uma mãe aguarda uma ligação que confirme que a filha ainda está viva. E com ela, o país assiste, mais uma vez, ao abismo entre o ideal de proteção consular e a dura realidade enfrentada por quem é tragado pelas engrenagens do crime global.
Da redação, com informações do Jornal da Paraíba.
[PTG-NPO-18102025-1015-4A7C9B2-V016]