Confronto entre indígenas e PM no Setor Noroeste de Brasília durante desocupação

Indígenas do Santuário dos Pajés enfrentam Polícia Militar em operação de desmatamento e cercamento de terreno no Setor Noroeste, autorizada por decisão judicial.

Na manhã de 15 de abril de 2025, indígenas da comunidade do Santuário dos Pajés, no Setor Noroeste de Brasília, entraram em confronto com a Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF) durante uma operação de desocupação conduzida pela Terracap (Agência de Desenvolvimento do DF). A ação, que envolveu desmatamento e cercamento de um terreno na quadra 707, próximo ao Santuário, foi autorizada pela desembargadora Kátia Balbino, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), e visava coibir ocupações irregulares e permitir obras de infraestrutura para uma nova quadra residencial. O episódio reacende tensões históricas entre indígenas e o governo em uma das áreas mais valorizadas da capital.

Detalhes do confronto

Segundo a Terracap, o terreno estava desocupado, conforme laudo de 26 de março de 2025 e imagens aéreas, sem presença de moradores ou comunidades indígenas. A operação, respaldada pela decisão judicial (Agravo de Instrumento nº 1007220-90.2025.4.01.0000), incluiu a demolição de um “barraco não residencial”. Durante a tentativa de negociação, a PMDF solicitou a retirada voluntária dos indígenas, mas, sem acordo, os manifestantes lançaram pedras contra os agentes, que reagiram com o Batalhão de Choque e a Cavalaria, usando “técnicas de controle de distúrbios civis”, como gás lacrimogêneo e balas de borracha. Imagens do Metrópoles mostram indígenas, incluindo crianças, enfrentando a ação policial, com relatos de truculência.

Lideranças indígenas, como Wenzo Maxacali, da Aldeia Teko Haw, denunciaram a falta de diálogo e a violência policial, afirmando que a operação começou sem aviso, com bombas e tiros. Apesar de estarem armados com arcos e flechas, os indígenas não os usaram. Não houve registro de feridos até o início da tarde. A Terracap concluiu o cercamento e o desmatamento ainda pela manhã.

Contexto do Santuário dos Pajés

O Santuário dos Pajés, também conhecido como Terra Indígena Bananal, é uma área de 32,5 hectares reconhecida em 2018 como território indígena, habitada por etnias como Fulni-ô, Guajajara, Tuxá e Kariri-Xocó. Localizado ao lado de condomínios de luxo no Setor Noroeste, onde o metro quadrado chega a R$ 16 mil, o território é alvo de disputas desde 2006, quando o bairro começou a ser construído. Indígenas afirmam que ocupam a região desde 1957, antes da fundação de Brasília, e lutam pela demarcação de 50 hectares, embora apenas 4,1 hectares tenham sido inicialmente garantidos pela Justiça em 2013.

A área em questão, na quadra 707, fica em frente ao Santuário, mas indígenas acreditavam que a Terracap tentaria invadir o território demarcado, que aguarda homologação final. Um laudo antropológico de 2011 confirmou a tradicionalidade da área, mas a Funai contestou o reconhecimento total, gerando conflitos. Em 2018, um acordo entre o Ministério Público Federal (MPF), Funai, Terracap e GDF ampliou a área reconhecida para 32 hectares, com compromissos de reflorestamento e infraestrutura, mas tensões persistem.

Denúncias e histórico de violência

Lideranças indígenas, como a cacique Cristiane Bororo, afirmam que a operação desrespeitou direitos ancestrais, com uso de spray de pimenta contra mulheres, idosos e crianças. Um confronto semelhante em fevereiro de 2025, na quadra 308, também foi marcado por denúncias de truculência, com vídeos mostrando tratores derrubando vegetação nativa. Posts no X, como do perfil @AmazonasPix, criticaram a ação como “tiro, porrada e bomba” no mês do índio, enquanto @brasilia_agora destacou a ausência de feridos.

Desde 2008, o Santuário enfrenta pressões imobiliárias. A Operação Caixa de Pandora, de 2009, revelou propinas para aprovar o Plano Diretor que viabilizou o Setor Noroeste, construído sobre um aquífero e um cemitério indígena. Episódios de violência, como incêndios de casas indígenas em 2009 e invasões por construtoras em 2011, marcam a resistência do pajé Santxiê Tapuya, que faleceu defendendo o território.

Posicionamento oficial

O GDF e a Terracap sustentam que a ação seguiu a legalidade, alinhada à Resolução nº 509/2023 do Conselho Nacional de Justiça sobre desocupações coletivas. Fernando Assis Bontempo, diretor jurídico da Terracap, afirmou que a operação protege o patrimônio público e respeita os direitos indígenas reconhecidos judicialmente. A Funai, em manifestação anterior, declarou que os ocupantes da quadra 707 não integram a comunidade contemplada pelo acordo de 2018, negando amparo jurídico à posse.

Impacto e perspectivas

O confronto expõe a tensão entre expansão imobiliária e direitos indígenas em Brasília, onde o Santuário dos Pajés é um símbolo de resistência. A área, cercada por condomínios de alto padrão, é uma das últimas faixas preservadas de Cerrado, com nascentes e valor cultural. Organizações como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) condenam a violência policial, enquanto a Justiça Federal continua a mediar o conflito. A demarcação definitiva do Santuário segue pendente, mantendo a incerteza para as 380 pessoas que vivem no território.

Com informações de Poder360, Metrópoles, G1, Correio Braziliense e posts no X

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