STF reabre investigações contra Bolsonaro arquivadas por Aras em menos de um mês
O Supremo Tribunal Federal (STF) acelerou o ritmo das apurações contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ao reabrir, em menos de um mês, frentes investigativas que haviam sido arquivadas ou paralisadas durante a gestão do ex-procurador-geral da República, Augusto Aras. Essa sequência de decisões, tomada por ministros Flávio Dino e Alexandre de Moraes, sinaliza uma nova fase de accountability no Judiciário brasileiro, priorizando a elucidação de indícios de irregularidades graves em meio a um contexto de polarização política. Esses movimentos não apenas resgatam narrativas de impunidade do passado recente, mas reforçam o compromisso das instituições com a defesa da democracia, especialmente em um país ainda marcado pelas cicatrizes da pandemia e dos atos de 8 de janeiro.
Reabertura do inquérito da CPI da Pandemia
O primeiro passo ocorreu em 18 de setembro, quando o ministro Flávio Dino determinou a instauração de inquérito para apurar as conclusões do relatório final da CPI da Pandemia, aprovado em outubro de 2021. O documento, um marco na accountability sanitária, recomendou o indiciamento de 78 pessoas e duas empresas, incluindo Bolsonaro por crimes como charlatanismo, prevaricação, infração de medidas sanitárias e epidemia culposa. Dino justificou a abertura ao afirmar que os requisitos legais estavam atendidos, destacando indícios de crimes contra a administração pública, como fraudes em contratos, superfaturamentos, desvios de recursos e uso de empresas de fachada.
Na época, Aras arquivou o caso alegando que o relatório não atendia aos padrões legais, podendo comprometer a ampla defesa e o contraditório, por falta de ligação clara entre provas e imputações. Essa decisão, criticada por senadores e especialistas como um entrave à justiça transicional, agora é revertida, com prazo inicial de 60 dias para as investigações. A retomada expõe as tensões entre o Ministério Público e o Legislativo durante o bolsonarismo, quando narrativas de desinformação sobre vacinas e tratamentos ineficazes custaram milhares de vidas, ampliando desigualdades sociais no Brasil.
Do ponto de vista analítico, essa reabertura vai além do simbólico: ela pode catalisar ações civis e penais contra redes de corrupção que exploraram a crise sanitária, beneficiando setores privados em detrimento da saúde pública. Em um país onde a pandemia agravou a pobreza extrema, especialmente no Nordeste, a apuração desses fatos é essencial para restaurar a confiança nas instituições e prevenir retrocessos autoritários disfarçados de “liberdade individual”.
Retomada da investigação sobre interferência na Polícia Federal
Em 16 de outubro, o ministro Alexandre de Moraes autorizou a reabertura do inquérito sobre a suposta interferência de Bolsonaro na Polícia Federal (PF), atendendo a pedido do atual procurador-geral, Paulo Gonet. Originado em 2020 com as denúncias de Sergio Moro – que acusou o então presidente de pressionar por mudanças na chefia da PF para acessar informações sigilosas sobre investigações envolvendo seus filhos –, o caso foi paralisado em 2023 por Aras, que alegou ausência de indícios suficientes para denúncia. Gonet, em seu parecer, defendeu uma apuração “com maior amplitude”, incorporando elementos de outras investigações que apontam para uma organização criminosa liderada por Bolsonaro, com uso indevido da Abin e do GSI para atacar o sistema eleitoral e disseminar fake news.
Moro havia relatado tentativas de ingerência em superintendências do Rio de Janeiro e Pernambuco, visando relatórios sobre familiares. A decisão de Moraes integra esses elementos a um mosaico mais amplo de ameaças à democracia, incluindo os eventos de 8 de janeiro de 2023. Essa conexão analítica revela padrões de obstrução sistemática, onde o poder executivo buscava instrumentalizar agências de inteligência para fins políticos, erodindo pilares como a independência policial e o Estado de Direito.
Críticos de centro-esquerda, como juristas e movimentos sociais, veem nessa retomada uma vitória contra a seletividade judicial, mas alertam para a necessidade de celeridade para evitar prescrições. A interferência na PF não foi mero episódio isolado; representou uma estratégia de controle narrativo que minou a luta contra a corrupção, beneficiando elites econômicas ligadas ao bolsonarismo em detrimento de reformas estruturais para equidade social.
Implicações políticas e jurídicas para o Brasil atual
Essas reaberturas ocorrem em um calendário sensível, com Trump assumindo nos EUA e ecos de populismo de direita no horizonte global. No Brasil, elas contrastam com o arquivamento sistemático sob Aras, visto por analistas como alinhado a uma agenda de proteção ao bolsonarismo. O STF, ao agir com rigor, reafirma sua role como guardião constitucional, mas enfrenta o risco de acusações de ativismo judicial, demandando transparência para legitimar suas decisões.
- Contexto da CPI: Relatório com 1.182 páginas expôs esquemas que custaram bilhões em desvios, com impacto direto na resposta à Covid-19.
- Inquérito da PF: Revela tentativas de politizar investigações, ligando-se a inquéritos sobre milícias digitais e o 8 de janeiro.
- Desafios futuros: Integração de provas de múltiplas frentes para evitar fragmentação e garantir julgamentos justos.
A sociedade brasileira, ainda dividida, merece respostas concretas. Essas investigações podem catalisar debates sobre reformas no Ministério Público e na Abin, promovendo maior accountability e inclusão de vozes periféricas nas narrativas de justiça transicional.
Reflexões sobre accountability e o pacto democrático
Em menos de 30 dias, o STF desenterrou casos que simbolizam os excessos do bolsonarismo, de negacionismo pandêmico a interferências institucionais. Dino e Moraes, com despachos fundamentados, priorizam o contraditório sobre o esquecimento seletivo. Contudo, o verdadeiro teste será a conversão de indícios em condenações, equilibrando punição com prevenção de revanchismos que enfraquecem a coesão nacional.
Para uma democracia madura, esses desdobramentos convidam à vigilância coletiva: sem impunidade, não há equidade. A reabertura não vingança, mas justiça – essencial para curar feridas sociais e pavimentar um Brasil onde o poder responda à sociedade, não a clãs políticos.
Redação do Movimento PB [GKO-AIX-18102025-STFRE-16P]