Saúde

Leucovorina e Autismo: A droga promovida por Trump que divide ciência e esperança de famílias

Leucovorina e Autismo: A droga promovida por Trump que divide ciência e esperança de famílias

Enquanto FDA acelera aprovação de medicamento para “deficiência de folato cerebral” em crianças com autismo, cientistas alertam para a falta de evidências robustas e os riscos de um precedente perigoso.

Há seis meses, o pequeno Jose Morales-Ortiz, de 4 anos, mal conseguia formar frases de duas palavras. Com um diagnóstico de autismo severo, ele não conversava nem respondia ao próprio nome. Hoje, seu guardião, Keith Joyce, conta emocionado que o menino descreve seu dia na escola e participa de diálogos. “A primeira vez que percebi que tive uma conversa com ele, eu chorei”, relata. Joyce credita a transformação a uma droga chamada Leucovorina, que acaba de entrar no centro de um intenso debate que mistura a esperança de milhares de famílias, ciência preliminar e a política controversa de Donald Trump.

Nesta semana, a Casa Branca anunciou que a FDA (a agência reguladora de medicamentos dos EUA) irá acelerar uma mudança no rótulo da Leucovorina, hoje aprovada para aliviar efeitos colaterais de quimioterapia, para que ela possa ser usada no tratamento de crianças com autismo que apresentam uma condição específica. “Isso dá esperança a muitos pais”, declarou o presidente Trump, que, na mesma coletiva, fez alegações sem fundamento ligando o analgésico Tylenol ao autismo e repetiu discursos antivacina.

Para quem não é da área, podemos simplificar alguns termos…

A teoria por trás do medicamento envolve o folato, um tipo de vitamina B essencial para o desenvolvimento do cérebro. A condição chamada deficiência de folato cerebral ocorre quando, por algum motivo (como anticorpos que bloqueiam sua entrada), essa vitamina não chega em níveis adequados ao cérebro, mesmo que os exames de sangue pareçam normais. A Leucovorina é, basicamente, uma forma de ácido fólico (o princípio ativo do folato) em alta dosagem, que teoricamente conseguiria “driblar” esse bloqueio e nutrir o cérebro, melhorando sintomas como a comunicação verbal.

A Ciência: Promessa Limitada vs. Ceticismo

A base científica para o uso da droga vem de estudos pequenos. Pesquisas lideradas pelo neurologista pediátrico Dr. Richard Frye mostraram que cerca de 75% das crianças com autismo que ele testou possuíam os anticorpos que bloqueiam a passagem de folato para o cérebro. Em ensaios clínicos limitados, ele observou que o tratamento com Leucovorina melhorou a comunicação verbal e a linguagem em uma parte dos pacientes. Outros pequenos estudos na França, Índia e China replicaram resultados modestos.

No entanto, a maior parte da comunidade científica pede cautela. A Fundação de Ciência do Autismo (Autism Science Foundation) declarou que “um padrão muito mais elevado de ciência seria necessário” para recomendar o tratamento. O Dr. David Mandell, da Universidade da Pensilvânia, aponta que o estudo mais rigoroso sobre o tema, realizado na China, mostrou uma mudança “minúscula, sem relevância clínica” em uma escala de avaliação. Um ex-oficial da FDA, que preferiu não se identificar, classificou a decisão como um “precedente perigoso”, acusando a agência de usar “ciência de baixa qualidade” para justificar uma mudança tão grande.

O Fator Trump e o Risco da Desinformação

A controvérsia é amplificada pelo endosso de Donald Trump, que mistura o anúncio com desinformação. A promoção da Leucovorina no mesmo evento em que ataca vacinas e faz alegações infundadas sobre o Tylenol preocupa especialistas. O risco é que pais desesperados, movidos pela esperança, ignorem a falta de evidências robustas e busquem tratamentos por conta própria.

Keith Joyce, o guardião de Jose, criou um grupo no Facebook para compartilhar informações sobre a droga, que já conta com mais de 10.000 membros. Ele relata uma tendência preocupante: pessoas correndo para comprar suplementos de ácido fólico de venda livre, que possuem dosagens muito inferiores às usadas nos estudos e podem conter aditivos problemáticos. “Estou tentando ignorar a fonte [Trump] e ser grato pela atenção [ao tema]”, diz ele.

A história da Leucovorina é um campo minado onde a esperança genuína de uma família encontra a ciência ainda em desenvolvimento e a política explosiva. Enquanto o caso de Jose é um testemunho comovente do potencial da droga, a ciência exige rigor. A intervenção da Casa Branca, atropelando o processo científico padrão, pode dar falso alento a muitos e minar a credibilidade da ciência. A questão que fica é se essa aposta ajudará um pequeno grupo de crianças ou se acabará por prejudicar uma comunidade inteira, faminta por respostas que apenas a pesquisa séria e paciente pode oferecer.

Traduzido e adaptado da CNN

Redação do Movimento PB [NMG-OGO-25092025-Q9R5S1-15P]


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