Saúde

STJ mantém prazo do Ozempic e acelera genéricos no Brasil

STJ mantém prazo do Ozempic e acelera genéricos no Brasil
STJ mantém prazo do Ozempic e acelera genéricos no Brasil

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu um veredito crucial que pode transformar o acesso a tratamentos para diabetes tipo 2 e obesidade no Brasil. Por unanimidade, a Quarta Turma negou o recurso da Novo Nordisk, mantendo o prazo original da patente da semaglutida, princípio ativo de medicamentos como Ozempic e Rybelsus. A decisão significa que a entrada de versões genéricas no mercado brasileiro não será adiada, com a patente atual expirando em março de 2026.

O imbróglio da patente e o impacto no SUS

A Novo Nordisk buscava uma extensão da exclusividade de sua tecnologia, alegando atrasos na avaliação do pedido de patente pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). Pela legislação brasileira, empresas têm 20 anos de exclusividade a partir do pedido. Se o pleito da farmacêutica fosse aceito, a patente da semaglutida, que deveria terminar em 2026, poderia se estender até 2038, atrasando significativamente a chegada de alternativas mais acessíveis.

Enquanto a batalha judicial se desenrolava, o Ministério da Saúde agiu para acelerar a aprovação de 20 novas canetas de semaglutida e liraglutida pela Anvisa. A expectativa é que, com a queda da patente, o mercado nacional seja inundado por opções mais baratas, impactando diretamente o acesso ao tratamento.

Semaglutida: a promessa para a saúde pública

A semaglutida é um análogo do hormônio GLP-1, que age no cérebro para diminuir o apetite, sendo fundamental no tratamento da diabetes tipo 2 e da obesidade. Atualmente, o alto custo desses medicamentos – uma caneta pode ultrapassar R$ 1 mil – inviabiliza sua inclusão na rede pública. O Ministério da Saúde estima um gasto de R$ 8 bilhões anuais para atender a demanda atual, quase o dobro do orçamento do Farmácia Popular em 2025.

Especialistas veem a decisão do STJ como um divisor de águas. Maria Edna de Melo, endocrinologista da Abeso, destaca que a chegada dos genéricos pode revolucionar o tratamento da obesidade no SUS. Hoje, a única opção pública é a cirurgia bariátrica, com acesso restrito a apenas 10% dos procedimentos. Com a redução dos preços, a semaglutida poderia ser incorporada, oferecendo um tratamento efetivo à raiz do problema, e não apenas às suas comorbidades.

Por outro lado, representantes da indústria farmacêutica argumentam que a restrição na extensão de patentes desestimula investimentos em pesquisa e inovação no país, ao reduzir o tempo efetivo de proteção das tecnologias.

O que o STJ decidiu e por quê?

A decisão da Quarta Turma do STJ reforça um entendimento já consolidado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2021. Naquele ano, o STF determinou que não há previsão legal para prorrogação de patentes devido a atrasos administrativos do INPI. Essa mudança colocou o Brasil em patamar regulatório semelhante ao da Europa, onde o prazo padrão é de 20 anos a partir do pedido de patente.

A Novo Nordisk alegava um atraso de até 12 anos na análise de seu pedido, o que, segundo a empresa, a prejudicava no tempo de exploração da tecnologia. Contudo, o doutor em direito e especialista em bioética Henderson Furst pontua que a empresa já tinha o direito de processar cópias desde a publicação preliminar, garantindo o tempo de direito.

Para os advogados Guilherme Coelho e Elias Nóbrega, do escritório Bermudes Advogados, a decisão do STJ é uma vitória para a coletividade, que terá acesso a medicamentos mais baratos. “A Corte Superior deixou claro que não há autorização legal para a extensão do prazo de patentes. Com isso, ganha a coletividade e o Sistema Único de Saúde poderão ter acesso à semaglutida a preços mais baixos”, afirmam.

Obesidade no Brasil: um problema de saúde pública

A decisão do STJ chega em um momento crítico: 7 em cada 10 adultos brasileiros estão acima do peso, e 31% já são obesos. A doença avança mais rapidamente nas populações que dependem do SUS, aprofundando desigualdades sociais. Atualmente, o sistema público não oferece medicação específica para obesidade, focando apenas no tratamento das consequências como diabetes e hipertensão.

A expectativa é que a queda das patentes e a consequente redução de preços permitam a incorporação da semaglutida e liraglutida no SUS. Pesquisadores como Lia Hasenclever indicam que a concorrência pode gerar uma queda drástica nos preços, como já visto com a liraglutida genérica, vendida a R$ 300. Isso abriria caminho para um tratamento mais estruturado e acessível, combatendo a obesidade em sua origem e, a longo prazo, reduzindo os custos para o sistema de saúde.

Há ainda a preocupação com o uso estético dos medicamentos, que escancara a desigualdade no acesso. Eduardo Nilson, pesquisador da Fiocruz, critica: “Estamos vendo pessoas fazendo o uso estético desses medicamentos. Enquanto isso, pacientes que precisam não têm acesso. Isso cria uma desigualdade no tratamento, só quem tem dinheiro tem direito de tratar a obesidade? Não pode ser assim.”

Maria Edna de Melo conclui que a incorporação dessas medicações, aliada a um suporte multidisciplinar, seria uma “revolução” para o SUS, tratando a obesidade em vez de apenas suas comorbidades, e, consequentemente, diminuindo os gastos públicos com doenças crônicas.

Da redação do Movimento PB.

[MPBAI | MOD: 2.5-FL | REF: 69421063]