Saúde

Vírus ‘do bem’: a caça ao inimigo das superbactérias no seu banheiro

A caça a um assassino de bactérias

Quando pensamos em vírus, logo nos vêm à mente doenças como Covid, gripe ou catapora. Mas e se eu te dissesse que existe um tipo de vírus que não está interessado em nos infectar, mas sim em caçar e destruir bactérias? Eles são conhecidos como bacteriófagos, ou simplesmente “fagos”, e podem ser a chave para tratar infecções que os antibióticos já não conseguem curar.

Em uma jornada científica fascinante, uma jornalista da BBC foi a campo — ou melhor, ao seu próprio banheiro — para capturar um desses “vírus do bem”. A missão, parte de um projeto da Universidade de Southampton, no Reino Unido, era encontrar fagos em águas sujas, com a esperança de que um deles pudesse ser a solução para uma infecção real e perigosa.

Do banheiro para o laboratório: uma descoberta inusitada

A caçada foi surpreendentemente simples. Com um kit de coleta, a jornalista recolheu amostras de água de um lago improvisado, de uma composteira e, na busca pela amostra mais “rica”, da água do seu próprio vaso sanitário, que não havia recebido descarga por algumas horas. Após o envio para o laboratório, a surpresa: o fago encontrado na privada foi capaz de destruir em laboratório uma bactéria retirada de um paciente com uma infecção urinária persistente e dolorosa.

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A prova estava na placa de Petri: onde antes havia uma cultura de bactérias crescendo, agora existiam “zonas mortas”, áreas onde o fago havia se alimentado e eliminado a infecção. A jornalista teve até a honra de batizar seu “vírus predador”, que agora carrega seu sobrenome.

Como funciona o vírus ‘predador’?

Os cientistas descrevem os fagos como uma espécie de módulo lunar: eles têm uma cápsula (a “cabeça”) e pernas finas que usam para “pousar” em sua presa. O processo de ataque é altamente eficiente:

  • Seleção do Alvo: Os fagos são extremamente específicos. Cada tipo de fago ataca apenas um tipo específico de bactéria, ignorando as células humanas e as bactérias “boas” do nosso corpo.
  • Injeção Genética: Após se acoplar à bactéria, o fago injeta seu próprio material genético dentro dela.
  • Transformação em Fábrica: O código genético do fago sequestra a maquinaria da bactéria, transformando-a em uma fábrica que produz centenas de novos fagos.
  • Destruição: Quando a bactéria está cheia de novos vírus, ela se rompe e morre, liberando os novos fagos para caçar mais bactérias do mesmo tipo.

Uma terapia antiga para uma crise moderna

A terapia com fagos pode parecer uma novidade, mas a ideia tem mais de um século. Ela foi uma área promissora da medicina no início do século XX, mas foi rapidamente ofuscada pelo sucesso dos antibióticos. Com os remédios funcionando tão bem, a pesquisa com fagos foi praticamente abandonada no Ocidente.

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Agora, o cenário mudou. O aumento das superbactérias, resistentes a todos os antibióticos conhecidos, criou uma crise de saúde global chamada de “pandemia silenciosa”, que já mata mais de um milhão de pessoas por ano. É neste contexto que os fagos ressurgem como uma das alternativas mais promissoras à medicina moderna.

O desafio é que, por serem tão específicos, é preciso encontrar o fago exato para cada infecção. Projetos como o “Phage Collection Project” estão pedindo a ajuda do público para criar uma “biblioteca” de vírus caçadores, na esperança de que, em um futuro próximo, os médicos possam prescrever um fago em vez de um antibiótico para salvar vidas.

Fonte: BBC Internacional

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