Ibovespa supera os 135 mil pontos pela primeira vez, impulsionado por expectativas de cortes nos juros dos EUA e desvalorização global do dólar.
A Bolsa de Valores brasileira encerrou a segunda-feira (19) com uma forte alta de 1,36%, alcançando 135.777 pontos, marcando o maior patamar da história do mercado acionário no Brasil. Este é o primeiro registro do Ibovespa, principal índice de ações do país, acima dos 135 mil pontos. Durante o dia, o índice chegou a atingir um pico de 136.179 pontos, estabelecendo uma nova máxima histórica.
Até então, a maior marca havia sido registrada em 27 de dezembro de 2023, quando o índice fechou em 134.193 pontos. Paralelamente, o dólar registrou uma queda de 0,99%, cotado a R$ 5,413, refletindo uma desvalorização global da moeda norte-americana. A cotação mínima do dia foi de R$ 5,376, mas a moeda acabou desacelerando a queda ao final da tarde.
O otimismo nos mercados foi alimentado pela crescente expectativa de que o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, possa reduzir as taxas de juros já na próxima reunião em setembro. A perspectiva foi reforçada pela divulgação de indicadores econômicos norte-americanos acima das expectativas na semana anterior, dissipando preocupações sobre uma possível recessão na maior economia mundial.
Na última quinta-feira (15), os pedidos de auxílio-desemprego nos EUA caíram para 227 mil na semana encerrada em 10 de agosto, abaixo da previsão de 235 mil feita por analistas consultados pela Reuters. Além disso, as vendas no varejo aumentaram 1% em julho, superando a estimativa de crescimento de 0,3%. Os dados de junho, que anteriormente mostravam estabilidade, foram revisados para uma queda de 0,2%.
“A perspectiva é de recuperação dos ativos de maior risco devido a indicadores que serviram de suporte para espantar por hora os temores de recessão global”, afirmou Marcio Riauba, gerente da Mesa de Operações da StoneX Banco de Câmbio. Ele acrescentou que “o conjunto de dados mostra que o ciclo de cortes de juros nos Estados Unidos pode ser iniciado sem que haja necessidade de uma redução mais agressiva.”
Até recentemente, o mercado majoritariamente esperava um corte de 0,50 ponto percentual na taxa de juros, atualmente entre 5,25% e 5,50%, com especulações até de uma reunião extraordinária do Fed. No entanto, as chances de um corte inicial de 0,25 ponto se tornaram mais prováveis, apoiadas por 77,5% dos investidores, segundo a ferramenta CME FedWatch.
A tendência é que o dólar se deprecie à medida que o Fed reduz os juros, uma vez que a moeda americana se torna menos atraente em comparação com outras moedas quando os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA, conhecidos como treasuries, caem. Essa lógica também se aplica à Bolsa brasileira e a outros mercados de ações. Quando os rendimentos dos treasuries, considerados os ativos mais seguros do mundo, diminuem, investidores migram para ativos de maior risco, o que em grande parte explica o recente avanço do Ibovespa.
Com esse cenário, o mercado agora volta suas atenções para eventos importantes desta semana. Na quarta-feira, será divulgada a ata da última reunião do Fed, e entre quinta e sábado, acontece o encontro de autoridades monetárias em Jackson Hole, Wyoming. O discurso do presidente do Fed, Jerome Powell, na sexta-feira, é especialmente aguardado. Já Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central do Brasil, fará uma palestra no sábado.
“O discurso de Powell está sendo muito aguardado porque pode guardar sinalizações sobre os próximos passos da taxa de juros por lá, ainda que os investidores já acreditem que um corte vai acontecer na próxima reunião”, observou Gabriel Meira, sócio da Valor Investimentos.
No cenário doméstico, cresce a expectativa por um novo ciclo de aumento na taxa Selic. Nesta segunda-feira, a XP Investimentos revisou sua projeção para a taxa básica de juros no final deste ano para 11,75%, acima da estimativa anterior de 10,50%. “Há um consenso no mercado financeiro brasileiro de que o BC irá aumentar a Selic na próxima reunião”, afirmou André Galhardo, consultor econômico da Remessa Online. O Comitê de Política Monetária (Copom) se reunirá nos dias 17 e 18 de setembro, coincidentemente com o Fed.
“Embora ainda haja dúvidas com relação à magnitude, o mercado aguarda que inicie-se um ciclo de aperto monetário que poderá durar até o começo de 2025”, explicou Galhardo. Essa expectativa é reforçada pela comunicação mais rígida adotada por membros do Banco Central, especialmente Gabriel Galípolo, diretor de política monetária e candidato favorito à presidência da autarquia após o término do mandato de Roberto Campos Neto.
Em evento realizado nesta segunda-feira, Galípolo enfatizou que o Banco Central aguardará as próximas quatro semanas até a reunião do Copom para obter “o máximo de dados” e “estar aberto” a todas as opções sobre a Selic. Ele também destacou que o cenário para a política monetária é cada vez mais desafiador, com projeções de juros mais elevados e uma inflação acima da meta, o que “gera um incômodo bastante significativo.”
“A probabilidade crescente de um aumento na taxa de juros no Brasil e a expectativa de uma redução nos juros pelo Fed, ainda que as magnitudes permaneçam incertas, aumentarão o diferencial de taxa de juros, atraindo capital para o Brasil”, explicou Galhardo.
Galípolo também negou ter sofrido qualquer tipo de pressão por parte do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) desde sua indicação para o Banco Central. “Jamais me senti pressionado a ter qualquer tipo de atitude a partir da minha indicação no BC. O presidente tem tido uma atitude republicana”, afirmou, trazendo alívio aos investidores ao afastar suspeitas de interferência política na instituição. Lula tem criticado o atual nível da taxa Selic e, particularmente, Roberto Campos Neto, a quem já se referiu como “cidadão” em várias ocasiões.
A diminuição de tensões, incluindo aquelas relacionadas ao cenário fiscal, tem atraído investidores de volta à Bolsa, conforme apontou Jennie Li, estrategista de ações da XP. “A temperatura tem abaixado sobre isso nas últimas semanas. Tanto é que vemos uma queda nos juros da ponta longa, pela diminuição dos riscos fiscais”, destacou.
No âmbito corporativo, o Ibovespa também foi beneficiado pelo otimismo em Wall Street e pelo desempenho positivo de ações da Vale e do Bradesco, que contribuíram significativamente para o avanço do índice. A mineradora subiu 1,60%, impulsionada pela alta no preço do minério de ferro na China, enquanto as ações preferenciais do banco avançaram 4,48%, após o Goldman Sachs recomendar a compra dos ativos e elevar seu preço-alvo.
Outras ações se destacaram, como Petz, que disparou 23,87% após concluir a fusão com a Cobasi, e Magazine Luiza, que subiu 10,65%. Por outro lado, a Petrobras fechou em queda, com suas ações ordinárias recuando 0,77% e as preferenciais 0,16%, em uma semana marcada pelo pagamento de dividendos. Entre as maiores perdas do dia, BB Seguridade caiu 3,33%, seguida por Weg (-2,74%) e PRIO (-2,66%).
Na sexta-feira anterior (17), o dólar havia fechado em queda de 0,28%, cotado a R$ 5,467, enquanto a Bolsa caiu 0,15%, encerrando em 133.953 pontos.
Texto adaptado de Folhapress