China intensifica combate ao uso indevido da inteligência artificial com campanha nacional de três meses

Por Redação do Movimento Pb
A China lançou neste mês uma ampla campanha nacional para coibir o uso indevido da inteligência artificial (IA), refletindo um modelo de regulação estatal que contrasta fortemente com a abordagem liberal adotada por países ocidentais. Com duração de três meses, a iniciativa, liderada pela Administração do Ciberespaço da China (CAC), busca proteger os direitos dos cidadãos, conter abusos corporativos e reforçar o uso ético da IA, num momento em que o tema ganha centralidade geopolítica e econômica no século XXI.
A campanha é estratégica tanto para o desenvolvimento tecnológico quanto para o fortalecimento da soberania digital chinesa, e levanta pontos relevantes para o Brasil — país que avança de forma tímida em sua regulamentação sobre IA e proteção de dados em meio ao lobby de big techs estrangeiras.
Duas fases: regulação firme e foco em segurança digital
A operação será dividida em duas etapas. Na primeira, o foco é eliminar aplicativos ilegais de IA, identificar conteúdo gerado artificialmente e coibir a comercialização de ferramentas como sintetizadores de voz e softwares de troca de rosto (“deepfake”). A meta é atingir quem explora dados biométricos, como rostos e vozes, sem consentimento — prática que ameaça o direito à privacidade.
Plataformas que não informam adequadamente quando o conteúdo é gerado por IA, ou que operam sem o devido registro estatal, também serão alvo. Tutoriais que ensinam como produzir falsificações digitais serão reprimidos, assim como o uso da tecnologia para manipular estudantes, pacientes ou investidores.
Na segunda fase, a meta será remover conteúdos prejudiciais ou enganosos produzidos por IA, com ênfase em fake news relacionadas à saúde, educação, justiça e economia. A ação também combate o uso de IA para se passar por especialistas, figuras públicas ou personalidades históricas, inclusive com o intuito de aplicar golpes financeiros ou manipular a opinião pública.
Soberania digital e responsabilidade estatal
Diferente da lógica de autorregulação defendida por grandes empresas de tecnologia, a China aposta em um modelo centralizado de vigilância e controle — criticado por setores conservadores no Ocidente, mas cada vez mais observado com interesse por países que buscam preservar sua autonomia diante da hegemonia das big techs.
O caso levanta um alerta importante para o Brasil. Sem uma legislação sólida e com forte dependência de plataformas estrangeiras, o país corre o risco de se tornar terreno fértil para desinformação automatizada, manipulação eleitoral e exploração de dados sensíveis da população.
Em 2023, o Congresso Nacional chegou a debater um marco regulatório da inteligência artificial, mas a proposta foi enfraquecida por pressões do setor privado e acabou engavetada. Enquanto isso, soluções nacionais em IA — como aquelas desenvolvidas em universidades públicas e institutos de pesquisa — seguem subfinanciadas.
Lições para o Brasil e papel estratégico do Estado
A ofensiva chinesa aponta para um caminho possível onde o Estado assume papel ativo na defesa do interesse público frente ao avanço tecnológico. Em vez de deixar o futuro da IA nas mãos de conglomerados multinacionais, o país asiático propõe um modelo que busca equilibrar inovação, proteção social e soberania informacional.
A experiência da China, mesmo com suas particularidades políticas, reforça a necessidade de um debate sério no Brasil sobre os limites éticos e legais da inteligência artificial, sobretudo diante de um cenário global cada vez mais marcado por desigualdade digital, fake news em massa e ataques à democracia.