Lei ‘pró-golpe’: Jurista alerta para brecha a outros criminosos

Um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional, que propõe uma redução de penas para crimes contra o Estado Democrático de Direito, levanta sérias preocupações no meio jurídico sobre seus possíveis efeitos colaterais. A principal delas é se a medida, focada nos réus da trama golpista de 8 de janeiro, poderia inadvertidamente abrir uma brecha para beneficiar outros tipos de criminosos no país.
O PL e a “Lei dos Crimes Contra a Democracia”
O Projeto de Lei 2192, relatado pelo deputado Paulinho da Força, busca alterar a Lei 14.197/2021, conhecida como a “Lei dos Crimes Contra a Democracia”. Ironicamente, essa legislação foi sancionada pelo então presidente Jair Bolsonaro. O PL visa especificamente a redução das penas para aqueles condenados por atos que atentaram contra o Estado constitucional.
Inicialmente, houve um temor de que a proposta pudesse beneficiar integrantes de organizações criminosas ligadas a outros delitos, como o tráfico de drogas. Contudo, conforme explicou o professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense, Gustavo Sampaio, em entrevista, o projeto evoluiu para restringir essa redução apenas aos crimes contra a democracia. “Por tudo que pude apurar, o projeto evoluiu para restringir essa redução das penas àqueles cometedores dos crimes contra o Estado constitucional e democrático de direito”, afirmou Sampaio.
Retroatividade e Impacto Imediato
Caso seja aprovada e sancionada (ou tenha um veto derrubado), a nova lei teria aplicação imediata e retroativa. Este é um princípio fundamental do direito penal em estados democráticos: a retroatividade da lei penal benéfica. Ou seja, se uma nova lei beneficia o réu ou condenado, ela se aplica a casos anteriores à sua promulgação.
Na prática, isso significa que os advogados dos condenados pelos eventos de 2022 e 2023 – incluindo os réus do 8 de janeiro e da trama golpista – se dirigirão ao Supremo Tribunal Federal (STF), especificamente à Primeira Turma e ao ministro Alexandre de Moraes, relator dos casos, para pedir a adequação das penas à nova legislação.
Mudanças na Progressão de Regime: A Grande Preocupação
A preocupação mais latente, no entanto, reside nas alterações propostas para a Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984), que define as regras para a progressão de regime (do fechado para o semiaberto, e deste para o aberto).
O “Pacote Anticrime” de 2019 (Lei 13.964) endureceu as regras de progressão, estabelecendo frações mais rigorosas (25%, 30%, 40% ou até 50% da pena cumprida em regime fechado, dependendo da natureza e gravidade do crime). O novo PL, contudo, sugere reduzir esse tempo de progressão para 1/6 da pena novamente, especificamente para os crimes contra a democracia.
“A dúvida que se está tendo agora é se essa redução para 1/6 para progressão como condição para progressão, é para crimes contra a democracia. Mas do jeito que está posto no projeto, fica a dúvida se não se vai aplicar um sexto também para progressão em outros crimes“, alertou o professor Gustavo Sampaio. Ele ressaltou que esse é um ponto que “talvez passe por algum ajuste fino dentro do Congresso Nacional antes dessa aprovação em definitivo”.
O impacto é significativo. Sampaio exemplificou que, em uma situação hipotética, a pena de reclusão em regime fechado de um condenado como Jair Bolsonaro, que cumpriria 6 anos e 10 meses, poderia cair para 3 anos e 4 meses, ou até menos com remissões por trabalho ou estudo.
A sociedade e os operadores do direito aguardam com atenção o texto final da futura lei, para determinar se ela trará apenas os benefícios intencionados para um grupo específico, ou se abrirá uma porteira para a progressão de regime de outras categorias de crimes, incluindo o crime organizado.
Da redação do Movimento PB.
